O fim dos tempos

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“Nenhum fogo, heroísmo ou intensidade de pensamento ou sentimento é capaz de preservar uma vida para além da sepultura” (Bertrand Russel)
Embora a frase de Bertrand Russel possa incomodar os leitores de fé que veem a morte apenas como um rito ou passagem, ela coloca em perspectiva exatamente o que a ciência, com os seus olhos míopes, consegue enxergar. De forma objetiva, para a ciência, o ciclo da vida tem um início, um meio e um inevitável fim. Às vezes há um sentimento de que esse ciclo passa devagar, às vezes há um entendimento de que está passando rápido demais. O fato é que vagaroso ou acelerado, ele certamente vai chegar ao fim, o que significa que nos dias atuais nossa morte e a morte de todos os seres vivos na Terra são certas.
Mas, o que diz a ciência sobre o Universo? Terá ele também uma morte certa?

Em um frio extremo
Há algum tempo li um artigo escrito por Michio Kaku – professor de física teórica na Universidade de Nova York – em que analisava a possibilidade da existência de universos paralelos ao nosso. De fato, se formos nos basear apenas nas leis que regem a física e a biologia atualmente, a idéia do universo paralelo suplanta a simplicidade ficcional para atingir um nível de realidade concebível. A começar por Einstein e sua teoria da relatividade, a qual dá margem à existência de “buracos de minhoca”, que nada mais são do que canais que interligam universos paralelos; ou a idéia inflacionária caótica de Andrei Linde – físico da Universidade de Stanford – que diz que, de universos “pais” podem brotar universos “filhos”, processo análogo às bolhas de sabão quando se dividem em duas ou mais. Essa discussão certamente está longe de terminar. Cientistas no mundo todo estão gastando muita energia para encontrar algo confiável nesse emaranhado de sonhos, idéias e teorias.
E o que leva essa gente toda a uma corrida desenfreada como nos tempos do faroeste à procura do ouro? Os motivos são vários, mas um deles tem relação com a sobrevivência dos seres vivos. Eu explico!
Desde que Edwin Hubble – astrônomo americano – descobriu que o universo vem se expandindo a velocidade crescente, a atenção dos cientistas voltou-se para as consequências desse processo. Uma delas, talvez a mais evidente, é o desaparecimento do próprio universo, que ao se expandir perde energia e tende a se apagar, como uma fogueira sem lenha. O que vai restar será um universo muito frio, contendo estrelas de nêutrons mortas e buracos negros. Quem sobreviveria em um ambiente inóspito desses? Provavelmente ninguém, e é por isso que o homem está ansioso por achar uma porta de entrada para um universo paralelo quentinho como o nosso.

Em um calor escaldante
Se por um lado as evidências científicas dão margem a um futuro universo congelante, por outro, e bem antes disso, o homem, a Terra e todo o Sistema Solar passarão por dias de calor intenso. O fato é que o Sol, como toda a existência que concebemos, também possui um ciclo caracterizado pelo nascimento, vida e morte. Quando ele estiver morrendo, se expandirá e se contrairá várias vezes, e logo na primeira expansão, tudo na superfície da Terra será literalmente torrado. Se você estiver lá…
Portanto, antes de encontrarmos um universo paralelo para vivermos, será melhor encontrar um outro sistema solar. A priori, temos tempo de sobra, mais ou menos 5 bilhões de anos.

Subjugando o destino natural
Se o nosso ciclo de vida beirasse os milhões ou quem sabe os bilhões de anos, provavelmente a busca por outros planetas habitáveis e até mesmo por universos paralelos não estaria tão longe de nossa realidade. Faríamos alegremente coro aos cientistas.
Mas, isso não ocorre. Nossa perspectiva de vida é infinitamente menor quando comparada à perspectiva do universo. Fincamos os pés no chão e mal conseguimos pensar além da sobrevivência do dia seguinte. Somos quase impelidos a dar um pequeno passo por vez, com o perigo de tropeçarmos. E na esteira desses pequenos passos, mal conseguimos enxergar e valorizar a preciosidade de ter à nossa disposição um planeta único que abriga a vida tão adequadamente. Definitivamente subjugamos a sua sustentabilidade e a observar essa perenidade de descasos, mesmo que por um milagre, dificilmente teremos condições de sobreviver aos rumos do destino natural do universo. Vamos continuar relapsos assim?
Para quem tiver interesse, o livro Mundos Paralelos de Michio Kaku não deixa de ser uma boa leitura.

(Colaboração de Wagner Zaparoli, doutor em ciências pela USP, professor universitário e consultor em tecnologia da informação).

Publicado na edição de nº 10405, de 26, 27 e 28 de junho de 2019.