

Estamos deixando para trás o modelo de pagamento por volume para abraçar uma saúde centrada em resultados reais para os pacientes.
O sistema de saúde brasileiro, assim como o de muitos países, passa por um momento de profunda reflexão. Durante décadas, o modelo de remuneração predominante baseou-se na quantidade de atendimentos e procedimentos realizados: quanto mais consultas, exames e prescrições, maior o faturamento dos serviços de saúde. Esse modelo, conhecido como “pagamento por serviço” (fee-for-service), foi eficiente em expandir o acesso, mas trouxe consigo distorções como desperdícios, atendimentos desnecessários e pouca ênfase na qualidade e na continuidade do cuidado.
Hoje, nova abordagem ganha força: a Remuneração Baseada em Valor (RBV). Nesse modelo, o foco não está na quantidade de atendimentos, mas sim nos resultados obtidos na saúde dos pacientes. Profissionais e instituições de saúde são remunerados com base em critérios como a melhoria clínica, a prevenção de complicações, a experiência do paciente e a eficiência no uso dos recursos.
Na prática, a RBV representa um convite à mudança de cultura: mais escuta ativa, mais atenção integral e menos procedimentos sem propósito. E é aqui que o farmacêutico clínico encontra uma oportunidade estratégica de ampliar sua atuação.
Enquanto profissional que compreende profundamente o uso racional de medicamentos, o farmacêutico está apto a contribuir de maneira significativa para a obtenção de melhores desfechos clínicos. Seja no controle de doenças crônicas, na revisão da farmacoterapia, na prevenção de interações medicamentosas ou no apoio à adesão ao tratamento, a atuação clínica do farmacêutico é capaz de gerar resultados mensuráveis, que importam no novo modelo de remuneração.
Programas de cessação do tabagismo, gestão de pacientes com hipertensão e diabetes, acompanhamento de idosos polimedicados e educação em saúde são apenas alguns exemplos de serviços farmacêuticos que, se estruturados com protocolos, indicadores e acompanhamento, podem ser integrados a esse novo olhar sobre o cuidado.
É claro que a transição para a remuneração baseada em valor exige desafios: sistemas de informação mais robustos, capacitação das equipes, mensuração de indicadores, integração entre os profissionais e mudança de mentalidade. No entanto, os ganhos são evidentes: uma saúde mais humana, sustentável, resolutiva e centrada nas pessoas.
Neste novo cenário, o farmacêutico clínico não é mais coadjuvante. É agente de mudança.
Precisamos sair do balcão e entrar no cuidado. Deixar de ser apenas repassadores de medicamentos e assumir nosso papel como educadores, orientadores e promotores de saúde.
Porque, no fim das contas, não importa quantos atendimentos fizemos.
Importa se o paciente melhorou.
(Colaboração de Luiz Assunção, farmacêutico bioquímico, com pós-graduação em acompanhamento farmacoterapêutico @luiz_assunção_farmaceutico).
Publicado na edição 10.918, de sexta a sexta-feira, 18 a 25 de abril de 2025 – Ano 100