A via da defesa tributária administrativa

José Mário Neves David

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Quando uma pessoa, física ou jurídica, é autuada pela Administração Pública, a ela devem ser asseguradas as garantias ao contraditório e à ampla defesa, nos termos do art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988. Em outras palavras, referidas garantias têm por objetivo conferir às pessoas o direito de se defenderem da autuação formalizada pelo Estado. Há, contudo, um importante detalhe que, em determinadas situações, pode ser crucial para a defesa dos interesses do autuado: o processo em que se discute a validade da autuação poderá ser conduzido não apenas no Poder Judiciário como, também, na esfera administrativa.
No âmbito fiscal, as autuações relacionadas aos tributos federais (por exemplo, o Imposto sobre a Renda), estaduais (tais como o ICMS e o IPVA) e municipais e do Distrito Federal (como o ISS e o IPTU, por exemplo) poderão ser contestadas no âmbito administrativo anteriormente a eventual judicialização do processo. O contribuinte, munido de provas e argumentos que possam ser utilizados em sua defesa, poderá, pessoalmente ou por seu representante legal, apresentar defesa administrativa escrita ao órgão responsável pelo processamento e julgamento da petição, observado o prazo legal para contestação administrativa, que, em geral, é de 30 dias contados da data em que o contribuinte tomou ciência da autuação. Enquanto aguarda o julgamento da defesa administrativa, o valor cobrado pela Administração Pública fica com sua exigibilidade suspensa, isto é, o contribuinte não pode, neste período, ser cobrado ou ter o débito executado judicialmente.
Como exemplo, no âmbito federal, eventual defesa administrativa deverá ser apresentada em até 30 dias contados da ciência da autuação pelo contribuinte, e será julgada por um colegiado de auditores fiscais da Receita Federal do Brasil. Caso o contribuinte obtenha decisão favorável – a autuação seja cancelada, por exemplo – e o valor do débito discutido seja inferior a R$ 2,5 milhões, o processo será encerrado e o contribuinte não mais será considerado devedor do Estado. Por outro lado, caso o contribuinte obtenha decisão desfavorável ou, mesmo com decisão que lhe seja conveniente, o débito discutido seja superior a R$ 2,5 milhões, poderá ser apresentado recurso pelo contribuinte e/ou pela União, em novo prazo de 30 dias. Referido recurso será julgado pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), em Brasília-DF, por um colegiado de 8 conselheiros, sendo 4 representantes da União e 4 dos contribuintes. Em caso de empate no julgamento, o voto decisivo será do presidente da turma julgadora, sempre um representante da União. Se o contribuinte obtiver decisão favorável, o processo será encerrado definitivamente; caso haja decisão desfavorável ao contribuinte, poderá a pessoa se socorrer do Poder Judiciário. Os procedimentos e regras aplicáveis às discussões tributárias administrativas em âmbito estadual, distrital e municipal podem variar, porém, no geral, possuem os mesmos prazos acima mencionados e se valem de duas instâncias de julgamento.
Há algumas vantagens na defesa do contribuinte em âmbito administrativo: (i) o próprio contribuinte pode preparar e apresentar sua defesa, caso assim queira e possua competência técnica para tanto; (ii) não há custos e taxas envolvidos na apresentação de defesa e eventual recurso; (iii) regra geral, os andamentos do processo são mais céleres do que no Poder Judiciário; e (iv) especialmente nas esferas federal e estadual, o julgamento dos recursos em segunda instância são mais técnicos e conduzidos por órgão com representantes dos contribuintes no quadro de julgadores, o que, em tese, aumenta as chances de êxito para o contribuinte. Vale destacar, contudo, que (a) a escolha pela defesa em âmbito administrativo não anula eventual e posterior defesa na justiça, porém a defesa diretamente perante o Poder Judiciário exclui a possibilidade de discussão na esfera administrativa; e (b) a depender do assunto e das especificidades da autuação e do tributo discutido, pode ser mais vantajosa, para o contribuinte, a defesa diretamente perante o Poder Judiciário.
Dessa forma, na hipótese de autuação tributária sofrida pelo contribuinte, seja ele pessoa física ou jurídica, deve ser considerada a via tributária administrativa como uma das opções de defesa. Nesse sentido, é fundamental que uma análise técnica e detalhada da infração e das especificidades da cobrança seja realizada, a fim de que a melhor estratégia processual e de defesa seja traçada e empreendida para que os interesses e os direitos do contribuinte sejam plenamente assegurados.

(Colaboração de José Mário Neves David, advogado em São Paulo-SP. Contato: [email protected]).

Publicado na edição nº 10431, de 28 de setembro a 1º de outubro de 2019.