
A vida é complexa, bela, por vezes confusa e imprevisível, porém sempre um emaranhado de sensações e sentimentos que nos fazem sonhar, sorrir, chorar, gritar – enfim, viver.
De tão imprevisível e complexa, a vida nos mostra suas facetas, prega peças e nos faz refletir. Queremos entender seus mistérios, suas peculiaridades, queremos respostas que possivelmente não teremos. Por isso é tão bonita.
O trágico acidente aéreo recentemente ocorrido no interior de Minas Gerais e que vitimou a cantora Marília Mendonça, seu produtor, seu assessor, o piloto e o copiloto é um daqueles eventos que paralisa e comove o País.
Independente de gostar ou não do estilo musical e do conteúdo das letras de Marília, era inegável, quase impossível refutar seu talento e o sucesso que fazia Brasil afora. Fora a dor dos familiares, o que choca nesta tragédia é a forma como a vida, às vezes, nos lembra de como o imprevisível – talvez, o injusto – está profundamente enraizado entre nós todos os dias de nossas vidas.
Marília era talentosa, jovem, batalhou durante anos até conquistar seu lugar ao sol. No auge, foi vítima do improvável. Um acidente aéreo é estatisticamente muito difícil de ocorrer, e demanda, na maioria esmagadora das vezes em que ocorre, uma confluência quase improvável de fatores para que venha a acontecer. Pois, com ela, sua equipe, piloto e copiloto, aconteceu.
Mais do que improvável, o acidente joga em nossa cara o lembrete de que a vida é um sopro. Não importa sua posição social, seu momento de vida, sua condição financeira, suas virtudes, sonhos e defeitos, o improvável está sempre à espreita.
Neste sentido, aqueles velhos clichês do “viva a vida”, “amanhã pode não chegar”, “só se vive uma vez”, cada vez mais ganham contornos de uma verdade quase inquestionável. Aquela conversa com o pai que não aconteceu, aquele abraço na mãe que ficou para depois, aquele jantar com a esposa que ficou para “quando der”, aquele futebol com o filho que foi transferido para quando estiver menos calor, estão pedindo atenção. Aproveite o aqui, o agora, aquela pessoa que você ama, pois a vida é um sopro.
Para Marília e equipe, aquele era mais um final de semana comum (não tão comum em razão do histórico recente de pandemia, mas isso é outra questão), de shows pelo Brasil, viagens de avião, deslocamentos rápidos e distância da família. Produzir cultura, arte, entreter fãs e famílias. Porém, o que era previsível, em poucos minutos se tornou tragédia.
O imprevisível deu o ar da graça – ou da desgraça, em alguns casos – e ceifou a vida de um jovem talento, no início da sua jornada, assim como de seu também jovem produtor, seu tio, do igualmente jovem copiloto e do experiente piloto, pai de família que cobria a folga de um colega de trabalho. O destino pode ser cruel às vezes.
A ideia deste artigo não é entristecer, tampouco ser negativo demais. Pelo contrário: o objetivo é ressaltar que a imprevisibilidade da vida, do amanhã, do daqui a pouco torna a vida esse misto de alegria e tristeza, tão belo, tão complexo e tão único.
Por isso, converse com seu pai assim que terminar este texto. Ouça atentamente as histórias que ele quer te contar. Abrace sua mãe bem forte e não solte enquanto ela não permitir. Faça um jantar especial para sua esposa e a receba com um sorriso e um vinho quando ela chegar. Jogue futebol com seu filho no sol do meio-dia, depois tomem um sorvete, um suco, um refrigerante, qualquer coisa que refresque a alma mais do que a alegria estampada no rosto do garoto. A vida é o aqui, o agora, aproveite. O imprevisível está à solta. A vida é um sopro.
(Claboração de José Mário Neves David, advogado e administrador de empresas. Contato: [email protected]).
Publicado na edição 10.624 de 13 a 19 de novembro de 2021.