O cérebro continua sendo um dos elementos mais misteriosos do corpo humano. Com o avanço da expectativa de vida das pessoas – de acordo com o IBGE, a média do brasileiro está na faixa dos 73 anos para o homem e 77 para a mulher – passamos a conviver com notícias de males do cérebro que antes não ouvíamos. Não é difícil saber de um parente próximo, um vizinho ou um antigo amigo que esteja convalescente do Alzheimer, por exemplo. Como ele, outras doenças neurodegenerativas como o Parkinson, o Huntington e a esclerose múltipla, passaram a ser assunto nas redes sociais e objeto de pesquisas ferrenhas em laboratórios mundo afora.
Ocorre que, a despeito das investidas científicas e das notícias encorajadoras recém divulgadas sobre compostos que inibem a morte de neurônios em camundongos, o mundo ainda está longe de se ver livre desses males.
Exercitando o cérebro
Uma das receitas para darmos uma vida saudável ao nosso cérebro é exercitá-lo, como fazemos com os músculos de nosso corpo. Não é necessário participar de uma olimpíada de matemática ou encher cem cadernos de palavras cruzadas, mas sim, fazer coisas diferentes daquelas que habitualmente realizamos em nosso dia-a-dia.
Larry Katz, neurocientista norte-americano, publicou em 2005 um livro chamado “Mantenha seu Cérebro Vivo” em que descreve ginásticas específicas para o cérebro. Por exemplo, escovar os dentes com a mão esquerda (para os destros), ver as horas através do espelho, fazer um percurso diferente quando for ao trabalho ou à escola, vestir-se com os olhos fechados, memorizar a lista de supermercado, enfim, realizar atividades que estimulem o cérebro a funcionar fora dos padrões convencionais do cotidiano.
Além disso, de acordo com o neurologista da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Ivan Okamoto, ter bons hábitos alimentares, refrear os vícios em cigarros e bebidas, praticar esportes com freqüência e levar uma vida em grupo costumam elevar a autoestima e deixar o cérebro turbinado.
Cérebro pouco
utilizado
Existe certa crença popular de que nós humanos utilizamos um percentual pequeno de nosso cérebro, coisa de 10%. Embora seja difícil rastrear a sua origem, o fato é que ela se espalhou pelo mundo com tal intensidade que se torna quase impossível acreditar que não há qualquer fundamento biológico ou fisiológico que a torne sustentável. Embora seja uma ideia atraente, pois sugere que teríamos uma capacidade ociosa de inteligência e criação, o fato é que a ciência consegue refutá-la de forma bem simples.
Senão, vejamos: se a crença se referisse à utilização de 10% das regiões cerebrais, poderíamos utilizar a técnica de ressonância magnética funcional para identificar as partes do cérebro ativadas e verificaríamos que para executar um simples abrir e fechar de mãos já utilizaríamos mais do que a décima parte do cérebro; por outro lado, se a crença se referisse a 10% das células usadas, a ciência também daria o seu golpe, haja vista que qualquer célula nervosa que deixa de ser utilizada, se degenera e morre ou é colonizada pelas áreas vizinhas.
Pensar e ajudar a pensar
De qualquer modo é importante saber que de cada dez células do cérebro, nove são do tipo neuróglias. O nome é complicado, mas essas células têm um papel importante na dinâmica cerebral, pois dão toda a assistência física e nutricional necessária aos neurônios, os exatos responsáveis pelo ato de “pensar”. Em outras palavras, cerca de 10% de nosso cérebro pensa e os outros 90% ajudam a pensar. Talvez uma coincidência com a velha crença.
O fato é que todos nós podemos aprender e melhorar o tempo todo se nos propusermos a fazê-lo. Mas, não vamos consegui-lo ativando uma porção de nosso cérebro em desuso. Isso realmente não passa de um mito.
Publicado na edição nº 9838, dos dias 7 e 8 de maio 2015.