O mundo passa por inúmeras instabilidades que geram incertezas e afetam a economia, as relações humanas e a fraternidade entre os povos. Estamos superando, aos poucos, a pandemia de Covid-19, que caminha para se tornar uma endemia. O conflito militar na Ucrânia não demonstra sinais de arrefecimento, e os acontecimentos futuros são imprevisíveis e potencialmente perigosos. A crise energética mundial afeta preços e contribui substancialmente para a inflação descontrolada em economias desenvolvidas, fruto, também, de políticas monetárias excepcionais efetivadas em tempos pandêmicos. A história não se repete, mas rima.
As incertezas no cenário mundial afetam, também, a economia brasileira. Especialmente porque o Brasil é um grande produtor e exportador de commodities, fundamentais para a segurança alimentar e energética em nosso país e no mundo e responsáveis por mais de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Com o choque entre oferta e demanda no planeta, os preços em alta das commodities favorece nossa balança comercial e traz bons ventos para determinados segmentos da nossa economia, dentre os quais o agronegócio. Mas o que, efetivamente, são as commodities, e como elas diretamente impactam nosso cotidiano?
Em termos simples, as commodities, plural do termo em inglês “commodity” (artigo ou objeto de utilidade, mercadoria, bem consumível), representam as matérias-primas básicas, com pouco ou nenhum processamento, as quais são destinadas à produção de mercadorias mais elaboradas. Para serem assim classificadas, as commodities necessitam preencher determinados requisitos, quais sejam: (i) devem ser produzidas em larga escala; (ii) não devem apresentar distinções entre as marcas que as produzem; (iii) devem possuir características uniformes entre si e alta perenidade; bem como (iv) devem ser amplamente comercializadas no mundo.
Destacam-se, entre as commodities, as de natureza energética (etanol, petróleo, gás natural e carvão, dentre outras), financeira (dólar estadunidense, euro e títulos públicos), dos metais (minério de ferro, ouro, prata, cobre, dentre outros) e agropecuária (soja, milho, algodão, café, açúcar, boi, trigo, dentre outras). Especialmente em relação a esta última espécie de commodities, isto é, as de natureza agropecuária, o Brasil é um grande e relevante produtor e exportador mundial, obtendo importante posição perante o mundo no fornecimento de tais matérias-primas e na segurança alimentar das populações humana e animal mundiais.
O preço volátil é uma das características marcantes das commodities, o qual acompanha em tempo real as oscilações entre oferta e demanda e a dinâmica da economia global. A cotação das commodities na Bolsa de Chicago (CBOT) é, hoje, o parâmetro mais comumente utilizado para fins de determinação dos preços dessas matérias-primas no mercado global, sejam elas consideradas “hard commodities” (que demandam mineração ou extração do solo, como o petróleo e o ouro) ou “soft commodities” (que são cultivadas ou criadas, como a soja e o boi). Tal volatilidade favorece ou prejudica a balança comercial brasileira, a depender da situação da economia global, o câmbio (cotação do real perante o dólar estadunidense) e o frágil equilíbrio geopolítico mundial.
Considerando que o agronegócio representa aproximadamente 25% da economia brasileira, que somos grandes produtores e exportadores de commodities, que nossa atividade extrativa mineral e de resíduos fósseis é relevante e que as commodities detém cerca de 40% de participação na bolsa brasileira (mais especificamente, no Índice Ibovespa), é fácil perceber que as oscilações do preço das matérias-primas, seja de valorização, seja de desvalorização, afetam diretamente não apenas a economia brasileira como, também, os preços de itens básicos no mundo, gerando pressão ou alívio inflacionário, a depender da direção de tais variações.
Nesse contexto, é importante que medidas de proteção sejam adotadas pelos governos, produtores e consumidores, a fim de mitigar os riscos inerentes às variações de preços das commodities nos mercados doméstico e mundial, assim como o Brasil caminhe, aos poucos e de forma planejada, para a produção de mercadorias mais elaboradas, para que fiquemos menos reféns das ondas e dos ciclos positivos de preços das commodities para desenvolvimento da economia nacional.
(Colaboração de José Mário Neves David, advogado e consultor. Contato: [email protected]).
Publicado na edição 10.708 – Quarta, quinta e sexta-feira, 19, 20 e 21 de outubro de 2022.