
Há um clima de ligeira euforia entre os especialistas do agronegócio nacional. Segundo projeções recentemente divulgadas pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), estima-se que o valor adicionado do setor agropecuário crescerá 15,5% em 2023, comparativamente ao ano de 2022. Trata-se de uma revisão para cima da projeção anteriormente divulgada pelo órgão, que apontava para um crescimento de 13,2% no ano para o setor.
O valor adicionado é uma métrica que aufere o valor total produzido no setor, isto é, o valor bruto da produção. Nesse cálculo são descontados os montantes referentes aos bens e serviços de outros setores que são consumidos ao longo da cadeia produtiva, tais como insumos, máquinas, implementos e equipamentos em geral. Dessa forma, o valor adicionado apontado pelo Ipea em suas projeções reflete a produção efetiva do Brasil ao longo do ano de 2023, em modelos matemáticos e estatísticos que levam em consideração as variáveis que afetam a produção no setor.
Dentre as principais causas para o aumento das projeções de crescimento do valor adicionado na agropecuária em 2023, destacam-se a alta do setor acima do esperado no segundo trimestre deste ano (crescimento de 17% em relação ao mesmo período de 2022), retrato de uma demanda superior à projetada, além de revisões positivas de previsões do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em relação às principais culturas e do bom desempenho da produção em determinados segmentos do setor, especialmente em carne bovina e de aves.
Há um destaque especial para a produção de soja e milho. Para a primeira, houve crescimento significativo de produção na região Sul do Brasil (61,4%, ante o segundo trimestre de 2022); já para o segundo, houve ganho de produção na casa de 17% na segunda safra. Destaque, também, para cana-de-açúcar (crescimento de 8,6%, face à estimativa anterior de 6,6%, no segundo trimestre) e algodão (majoração da produção nos meses de abril a junho de 10%, contra 2,9% da análise passada). Crescimento, também, de produção de carne bovina estimado em 7% (ante 3,3% projetado) e de carne de frango de 6,3% (contra estimativa anterior de 2,7%). Todos estes dados contribuíram significativamente para a elevação das projeções pelo Ipea para o setor agropecuário.
Vale destacar, contudo, que as projeções do Ipea para o crescimento do valor adicionado do setor agropecuário em 2024 são mais tímidas, de apenas 0,4%. Isso se deve à expectativa de que, dentre as cinco principais culturas de produção no Brasil (soja, milho, algodão, cana-de-açúcar e arroz), somente a produção de soja deverá apresentar crescimento (5,1% em 2024, face a 2023). Como exemplo, o milho, após o boom de crescimento em 2023, deve retrair 9,1% no valor adicionado de produção em 2024, ao passo que o algodão terá diminuição projetada de 5,5% em 2024, frente ao atual ano. Por sua vez, há expectativa de crescimento, ainda que tímido, da pecuária em 2024, especialmente de aves e suínos.
Logicamente, os números apresentados pelo Ipea, tanto para 2023 quanto para 2024, são ainda um rascunho dos números oficiais, que serão calculados e apresentados de forma definitiva ao final de cada ano. Projeções estão sujeitas a inúmeras variáveis, tanto que o instituto revisou os números para 2023, conforme verificado acima. Porém, são importantes indicadores para os produtores e, especialmente, para o mercado acerca da direção da produção agropecuária nacional.
Nesse contexto, o que se conclui dos números apresentados é que o valor adicionado da produção em 2023 será ligeiramente maior do que o que se esperava no início do ano, um bom sinal de demanda mais aquecida do que o aguardado crescimento consistente da produção. Já em 2024, o cenário é de cautela em relação ao ganho de valor em produção, exceto para a soja, já que mercados que cresceram vigorosamente nos últimos meses tendem a se retrair por questões geopolíticas, macroeconômicas e de mercado, especialmente quanto ao algodão e ao milho. A pecuária, considerando um ano difícil em 2023, deve apresentar leve melhora, mas ainda longe do cenário sonhado pelos pecuaristas.
(Colaboração de José Mário Neves David, advogado e consultor. Contato: [email protected]).
Publicado na edição 10.792, sábado a terça-feira, 30 de setembro a 3 de outubro de 2023