Está a chegar o S. João. […] No largo da Matriz, ladeados por alvas barraquinhas, erguem-se, já elegantes, os coretos destinados aos leilões de prendas, que constituem, inegavelmente, os maiores atrativos das festividades. Das vizinhanças já começam afluir forasteiros à nossa terra e, movimentada, a cidade toda apresenta um aspecto agradável, […]. São João, o santo amado dos moços, é, entretanto, o fator de todo esse movimento. […] Bebedouro está, pois, em festas.”
Foi desta forma que o Jornal de Bebedouro anunciava na edição de 15 de junho de 1919, o início de mais um período de festas dedicadas ao padroeiro São João Batista, indicando o quanto sua realização alterava a rotina dos moradores da cidade e da região.
De fato, a festa já se tornara um hábito, conforme deixou registrado Monsenhor Aristides da Silveira Leite, “as tradicionais festas que vem sendo realizadas em Bebedouro, sem interrupção de um anno siquer, desde a fundação da cidade até os nossos dias (1931), não obstante as sérias difficuldades do momento, motivadas pela crise, foram realizadas este anno com a máxima pompa possível, graças à piedade do povo de Bebedouro”.
A afirmação do Monsenhor pode ser confirmada por meio dos registros feitos na imprensa, pois a cada ano, anúncios de páginas inteiras eram inseridos nos jornais. Na edição de 9 de junho de 1907, por exemplo, sob título “Pomposa Festa de S. João”, o Jornal de Bebedouro apresentava a vasta programação, que incluía a alvorada; novena; levantamento do mastro; coleta de esmolas; missa cantada; majestosa procissão composta de numerosos andores, caprichosamente ornamentados e acompanhados pelas respectivas irmandades, anjos e virgens.
Acompanhando a programação religiosa, eram oferecidas “diversões profanas”, conforme o anúncio: “excellentes companhias de Cavallinhos, Dramatica e Touromachica, que serão convidadas para esse fim. Haverá também: pau de sêbo, corridas de bycicletas e em sacos, com prêmios de 50, 100 e 200 réis. […] No Largo da Matriz, permanecerão durante a festa grande quantidade de barracas, botequins, como de costume”.
Nos anos seguintes a programação da Festa se manteve com a mesma pompa, procurando manter os eventos de caráter religioso e a diversidade de atrações que garantisse a ampla participação da sociedade, então hegemonicamente católica.
Desta forma, a cada ano, eram anunciadas novas atrações. Em 1910, por exemplo, foram apresentadas várias cavalhadas e a “Banda Democrata Bebedourense”. Em 1912, entre as “diversões profanas”, a apresentação de companhias equestres e de variedades, touradas, jogos lícitos e outros. Em 1918, “surpreendentes voos de aeroplano”; e em 1922, um “balão monstro”, o maior que já fora solto até então.
Outro aspecto a se destacar é a significativa participação da comunidade, nas comissões organizadoras, no comando de barracas ou mesmo prestigiando a Festa, principalmente dos leilões de prendas, principal fonte de arrecadação. Conforme era informado, a destinação dos rendimentos era sempre em prol de obras e projetos da comunidade católica, como a construção e/ou manutenção da Igreja Matriz; Colégio Anjo da Guarda, Asilo São Vicente de Paulo, Santa Casa de Misericórdia e outras.
Pessoas de maior renome eram convidadas para serem membros das Comissões, emprestando seu prestígio para maior brilhantismo da Festa, como Abílio Manoel, João Manoel, Conrado Caldeira, Abílio Alves Marques, Vicente Paschoal, Manoel Fragoas Ogando, Lucas Evangelista, Adriano Garrido e Oscar Werneck, entre outros.
Destaque ainda para a participação feminina, como festeiras e nas comissões. A primeira citada foi Flausina Honoria da Conceição, em 1909. Nos anos seguintes constam nomes como Donina Valadão Furquim, Malvina Frahia, Ermelinda Duarte Ferreira, Maria Novaes Manoel, entre outras.
Tanto empenho invariavelmente contribuía para bons resultados, conforme foi registrado ao final da Festa de 1929: “excedeu em brilhantismo a todas as expectativas que, aliás, lhes eram assaz favoráveis, os imponentes festejos em louvor ao padroeiro desta cidade, o glorioso São João Batista”.
Nas décadas seguintes e até a atualidade, a festa teve continuidade, sempre com o apoio de significativa parcela da sociedade, passando por algumas adaptações, de acordo com o contexto de cada época, mas mantendo a essência de um evento que envolve o âmbito religioso, festivo e de solidariedade.
(Colaboração de José Pedro Toniosso, professor e historiador bebedourense)
Publicado na edição 10.729 – De sábado a terça-feira, 28 a 31 de janeiro de 2023