Gripe Aviária no Brasil

José Mário Neves David

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As autoridades sanitárias brasileiras confirmaram a existência de focos de Influenza Aviária de Alta Patogenicidade (IAAP), ou Gripe Aviária, em uma granja comercial no município de Montenegro e no zoológico de Sapucaia do Sul, ambos no Rio Grande do Sul. Até a conclusão desse texto, estava em curso a investigação sobre outros potenciais focos em granjas comerciais, criações de subsistência e aves silvestres em municípios de Santa Catarina, Tocantins, Rio Grande do Sul, Ceará e Pará.

Apesar de o risco de infecções em humanos ser considerado baixo, ocorrendo apenas em casos de contato direto com aves infectadas, os impactos econômicos e comerciais dos casos confirmados são substanciais para o Brasil. Seja por força da aplicação automática de protocolos sanitários, seja em razão do fechamento preventivo de mercados por nossos clientes internacionais, variados países já suspenderam temporariamente as importações de carne de aves do Brasil.

China, os integrantes da União Europeia, Japão, Argentina, México e Coreia do Sul, dentre outros possíveis parceiros comerciais, suspenderam por tempo indeterminado as exportações brasileiras de aves, o que representa uma diminuição das receitas de exportação para o Brasil de ao menos USD 100 milhões ao mês. A expectativa é que as suspensões se estendam por, no mínimo, 30 dias, podendo esse prazo ser superior a depender das implicações das infecções no Brasil e da resposta das autoridades brasileiras a respeito da crise sanitária.

Até o momento, a atuação das autoridades brasileiras, especialmente do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), é exemplar. O país possui um plano nacional de contingência para a Gripe Aviária que abrange ações de vigilância, controle e comunicação da patogenicidade, em protocolos e ações transparentes e céleres. Nesse contexto, o Brasil possui infraestrutura laboratorial e profissionais capacitados para o diagnóstico e resposta rápida a surtos, como o da IAAP. Na prática, ocorreu o descarte controlado de ovos e aves contaminadas, com limpeza e desinfecção de plantas produtivas e instalação de barreiras sanitárias para controle e trânsito de animais.

Sob o ponto de vista comercial, a detecção da Gripe Aviária no Brasil gera efeitos imediatos. Além da suspensão temporária das exportações, pode ser verificada a perda, por tempo indeterminado, de mercados-chave pelos produtores e exportadores nacionais. O Brasil é o maior exportador mundial de carne de aves, especialmente de frango, e um embargo prolongado, ainda que regional, pode representar perda de mercado para concorrentes, como os Estados Unidos da América (EUA) e Tailândia. Ademais, alguns compradores internacionais podem exigir preços mais baixos para a compra da produção brasileira devido ao risco sanitário percebido.

Para o consumidor brasileiro, o aumento da oferta interna de produtos, dada a impossibilidade temporária de exportação para alguns países e blocos comerciais, pode direcionar um maior fluxo de carne de aves, notadamente de frango, para o mercado doméstico, pressionando os preços para baixo e reduzindo as margens para criadores e integradores. Apesar de a carne de frango ser segura se bem cozida, eventual receio da população brasileira para consumo dessas proteínas pode pressionar ainda mais para baixo os preços ao consumidor final – uma oportunidade de consumo a preços convidativos para redes varejistas e consumidores finais que não se preocuparem com a situação.

Apesar da turbulência momentânea, os acontecimentos reforçam o preparo das autoridades brasileiras para lidar com a situação e, especialmente, destacam a transparência de todo o processo, algo, infelizmente, não tão comum quando se trata da atuação das instituições brasileiras perante crises. No mais, a detecção de IAAP no país deve acelerar ainda mais os investimentos em prevenção, rastreabilidade e controle sanitário no Brasil, o que pode aumentar a confiança dos clientes internacionais, atuais e potenciais, a respeito do produto brasileiro, gerando perdas momentâneas, porém ganhos futuros. Assim, acompanhar os próximos acontecimentos a respeito dessa crise é fundamental, a fim de que possamos entender a dimensão e duração do período de turbulência para o setor de carne de aves.

(Colaboração de José Mário Neves David, advogado, conselheiro e consultor. Contato: [email protected]).

Publicado na edição 10.926, de sábado a terça-feira, 31 de maio, 1º a 3 de junho de 2025 – Ano 100