Índia a caminho das estrelas

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A Índia é um país de grandes diversidades, e por que não dizer, de grandes contradições. Considerada a maior democracia do mundo com 1,2 bilhão de habitantes, vive o capitalismo extremo composto de pequenos grupos de afluentes milionários e grandes porções de população vivendo na miséria absoluta.
De acordo com o Banco Mundial, um terço da população pobre do mundo vive naquele país. Em números, mais de 300 milhões de indianos sobrevivem com cerca de três reais por dia (imagine você, caro leitor, vivendo com essa quantia para atender a todas as necessidades básicas, como se alimentar, morar, vestir, etc).
Como no Brasil, que ainda convive com 20 milhões de habitantes na pobreza extrema, a corrupção do sistema político na Índia é um dos maiores entraves para colocar o país nos trilhos da Meta do Milênio, programa de erradicação da pobreza proposto pela Organização das Nações Unidas.
Não nos esqueçamos de que a grande tônica da pobreza está calcada nos critérios de renda e fome, mas de carona vem a falta de educação mínima, saúde e moradia. Em outras palavras, a definitiva baixa qualidade de vida.

Tecnologia promissora

A era de Nehru (Jawaharlal Nehru, primeiro-ministro indiano entre 1947 e 1964) construiu as bases para uma Índia tecnológica. Tanto que na década de 1970 o país já havia conseguido reunir elementos suficientes para construir a bomba atômica, privilégio de poucas nações como os Estados Unidos, a Rússia, China, Reino Unido e França.
Já nos anos 2000 a meta estabelecida foi o lançamento de mísseis de longo alcance, suficientemente avançados para chegar à China ou mesmo ao Leste Europeu, conquista esta obtida recentemente em 2012.
Mas, somente agora em 2014 é que o país mostrou de fato o seu poderio tecnológico ao colocar um satélite na órbita do planeta Marte.

Na pegada espacial

A notícia da chegada da sonda indiana Mangalyaan em Marte no final de setembro último percorreu o mundo na mesma velocidade com que a sonda percorreu a distância entre a Terra e o planeta vermelho. Lançada em novembro de 2013, ela se desprendeu dos propulsores 44 minutos após o lançamento, permanecendo na órbita da Terra por quase um mês para adquirir velocidade suficiente e enfrentar os 780 milhões de quilômetros que separam os dois planetas.
Com meio século de vida o programa espacial indiano, e em especial, a missão a Marte, carregam características singulares. A primeira delas refere-se ao baixo orçamento. Para se ter idéia, a missão Mangalyaan custou 74 milhões de dólares, cerca de um décimo do custo da missão americana Maven, cuja sonda também chegou a Marte em setembro. A segunda característica resume-se à eficiência e precisão da missão: os indianos chegaram a Marte na primeira tentativa, feito único até o momento. A China, que também disputa a corrida espacial fracassou em missão semelhante em 2011, bem como o Japão em 2003.
Oposições internas
Embora chegue ao mundo a idéia de sucesso absoluto devido às conquistas espaciais, internamente a Índia vive um antagonismo. Críticas fazem coro de oposição aos gastos que privilegiam a tecnologia em detrimento à sustentabilidade da vida.
É difícil prever se no futuro a ciência espacial daquele país trará claramente benefícios a sua população como ocorreu com os programas americanos e soviéticos durante a segunda metade do século 20. É certo que a ciência aplicada, embora desperte sonhos e inspirações, por si só dificilmente conseguirá reverter uma situação tão desfavorável quanto a que vive a Índia. A luta contra a corrupção e o incentivo perene à educação são fatores essenciais que deveriam pautar as agendas governamentais. Se a Índia marcou pontos para a história com o progresso espacial, certamente deveria marcar mais alguns com essas singelas agendas. Afinal, são 300 milhões de bocas famintas esperando um pouco mais do que somente o brilho das estrelas.

Publicado na edição nº 9765, dos dias 30 e 31 de outubro de 2014.