
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo promove interessante projeto sob esse título: “juridiquês não tem vez”. É um movimento destinado a tornar a linguagem jurídica acessível a todos os mortais.
Não se pode esquecer que justiça é um equipamento destinado a solucionar problemas e deve estar ao alcance dos humanos, todos eles, e não apenas aos iniciados.
Quando levado por meus pares, a assumir a Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo no biênio 2012 2013, tentei implementar uma tática para reduzir as peças processuais a 5 laudas. Depois de muitos debates, conseguimos chegar ao limite de 10, pois havia muita resistência à redução numérica do linguajar utilizado pelos chamados operadores do direito.
É difícil avançar numa área de simplificação, dentro de um universo imerso em conservadorismo rançoso e hostil a qualquer modificação que possa parecer herética, ou seja, tornar o direito compreensível pelos jejunos.
Mas acredito que a chegada dos nativos digitais ao sistema justiça possa abrir uma fenda no anacronismo. Anima-me tomar conhecimento dos estudos VisuLaw, que reúne mais de 100 profissionais entusiastas da aplicação da técnica chamada Visual Law. Entre maio e novembro de 2020, cerca de 150 juízes federais se submeteram a uma pesquisa sobre a aceitação de elementos visuais nas petições. Isso facilitaria a apreensão do tema controverso e mais adequada resposta a pretensão dos demandantes.
A conclusão foi que os juízes reclamam sobre argumentação genérica e redação prolixa, mas também criticam a falta de estética e de objetividade. Dentre os juízes participantes, 62% criticam o excesso de páginas e 44% o de transcrição de jurisprudência nas petições. 31% deles também salientam a má formatação da peça.
O movimento Visual Law quer imprimir objetividade nas petições para que fiquem mais claras e compreensíveis aos magistrados.
É paradoxal que o advento das modernas tecnologias da comunicação e da informação não tenha repercutido no funcionamento dos inúmeros tribunais brasileiros, em regra produtores de peças com dimensões excessivas e com linguajar que sempre necessita de decodificação para que a parte saiba o que aconteceu.
Os millenials, com a desenvoltura no manuseio da eletrônica e da informática, poderão fazer a diferença. É o que os tempos aguardam com certa ansiedade.
32: soma de sonhos
A magna celebração bandeirante é o 9 de julho, a recordar a Revolução Constitucionalista de 1932.
Estivesse ainda entre nós, o inesquecível Paulo Bomfim, o último dentre os Príncipes da poesia brasileira entoaria louvores como sempre fez, durante sua vida gloriosa, a enaltecer os brios paulistas.
Ele indagava: “O que foi 32?” e respondia: “Foi a soma do sonhos e o sacrifício de um povo, a confraternização de raças e condições sociais no batismo das trincheiras, o esforço da indústria, o desprendimento do comércio, a grandeza de uma causa, a generosidade dos moços, a participação dos cabelos brancos, o entusiasmo das crianças, a força que vem da mulher da terra paulista, o verbo dos poetas e dos tribunos, dos jornalistas e dos sacerdotes, a sacralidade da lei, o fuzil ao lado do livro, a trincheira continuação da escola, a caserna dependência do lar e o campo de batalha sementeira da justiça”.
Continuaria a revolver tesouros ancestrais deste chão de bravos, que deveriam ser insculpidos nos corações juvenis, para que esta mocidade abúlica e desalentada recobrasse o ânimo de converter o Brasil real na Pátria de nossos sonhos. Pois o poeta continua: “O que foi 32?”, para proclamar: “Foi a bandeira que voltou do passado, o passado que se transformou em bandeira, bênção de Anchieta e de frei Galvão, vigília de João Ramalho, grito de guerra de Tibiriçá, inspiração de Bartira, presença dos que partiram, convocação do amanhã, cocar-capacete de aço, jibão que virou farda cáqui, canoa monçoeira transformada em trem blindado, mortos e vivos marchando; igreja, escola, oficina em batalhões rezando a mesma oração, prece de amor e esperança, holocausto e clarinada, asa de glória gravando no sangue dos das gerações”.
Nestes oitenta e nove anos da épica aventura em que São Paulo testemunhou ao mundo inteiro, o seu apreço à democracia e ao Estado de Direito, nada mais significativo do que render homenagem a esse amor tão bem demonstrado por Paulo Bonfim, que rezou: “Enquanto houver injustiça, enquanto houver sofrimento, enquanto a terra chorar, enquanto houver pensamento, enquanto a história falar, enquanto existir beleza, enquanto florir paixão, enquanto o sonho for sonho, enquanto o sangue for sangue, enquanto existir saudade, enquanto houver esperança, enquanto os mortos velarem, é sempre 9 de julho!”.
(José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Presidente da Academia Paulista de Letras, gestão – 2021- 2022).