Medicamentos e boca seca no idoso: um problema subestimado

Luiz Assunção

0
9
Dr. Luiz Antônio da Assunção, farmacêutico clínico, CRF 23.110 SP, Pós-graduado em acompanhamento farmacoterapêutico; e em gastroenterologia funcional e nutrigenômica. Foto: Divulgação

A boca seca, ou xerostomia, é uma queixa comum entre idosos e pode parecer um desconforto menor à primeira vista. Porém, ela carrega riscos importantes: dificuldade para mastigar e engolir, alterações no paladar, maior risco de cáries, infecções bucais (como candidíase) e até prejuízos nutricionais.

O que poucos percebem é que o uso de medicamentos é hoje uma das principais causas de xerostomia no idoso.

Mais de 400 medicamentos são capazes de reduzir a produção de saliva, e muitos deles estão presentes nas prescrições de rotina para doenças crônicas. Entre os principais vilões, destacam-se: Antidepressivos tricíclicos (amitriptilina, nortriptilina); Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) como paroxetina; Antipsicóticos; Anti-hipertensivos (especialmente diuréticos como hidroclorotiazida); Anticolinérgicos (usados em distúrbios urinários, respiratórios e neurológicos); Opióides analgésicos; Antihistamínicos (para alergias).

O idoso, já naturalmente predisposto à redução da função das glândulas salivares pelo envelhecimento, torna-se ainda mais vulnerável quando está exposto à polifarmácia – ou seja, ao uso simultâneo de vários medicamentos.

Por que devemos nos preocupar?

A saliva tem funções que vão muito além da lubrificação da boca: ela protege a mucosa, controla a flora bacteriana, participa da digestão inicial dos alimentos e é fundamental para a sensação de conforto oral. Sem ela, o idoso enfrenta: aumento de cáries e infecções, dificuldade de fala e deglutição, perda de apetite e desnutrição, comprometimento da qualidade de vida.

O que deve ser feito?

A avaliação farmacológica regular dos medicamentos em uso é essencial. Um clínico farmacêutico pode identificar medicamentos que contribuem para a xerostomia e sugerir alternativas ou estratégias de manejo como, troca de medicamentos por opções com menor potencial de causar boca seca, ajustes de dose, uso de estimuladores salivares ou saliva artificial, cuidados locais com a higiene bucal e hidratação constante.

Além disso, é fundamental conscientizar o paciente e os cuidadores sobre a importância de relatar sintomas de boca seca e não simplesmente aceitá-los como “normais da idade”.

Portanto,  a xerostomia em idosos frequentemente é iatrogênica. Entender esse impacto é essencial para garantir qualidade de vida, saúde oral e nutricional para essa população.

Medicamento é ferramenta de tratamento, mas seu uso irracional ou mal monitorado pode trazer mais danos que benefícios.

Farmacêuticos clínicos, dentistas geriatras e médicos atentos podem fazer toda a diferença nesse cuidado.

Publicado na edição 10.923, de sábado a sexta-feira, 17 a 23 de maio de 2025 – Ano 100

(Colaboração de Luiz Antônio da Assunção, Farmacêutico Clínico, CRF 23.110-SP. Especialista em acompanhamento farmacoterapêutico e nutrição funcional, articulista de Saúde e Bem-estar).