Colunista - Advogado que atua na área do meio ambiente, Gabriel Burjaili

Episódios dramáticos têm sido cada vez mais noticiados global e localmente, com causas diversas: ora por excesso de chuvas, ora pela extrema secura. Tragédias causadas por nevascas, pessoas morrendo por conta do calor excessivo. Essa tem sido anunciada como uma das possíveis consequências das mudanças climáticas: eventos climáticos severos serão cada vez mais frequentes, e cada vez mais intensos.

Na nossa realidade local, é senso comum que o período que estamos atravessando em nossa região não é, sob uma percepção popular e histórica, “normal”. Mesmo as pessoas mais velhas relatam não se lembrar de um inverno tão quente e seco como o que se findou há pouco. Profissionais do campo estão há semanas em estado de alerta. E essa percepção popular não está errada.

Dados mostram que os meses de agosto e setembro de 2024 bateram seguidos recordes de seca e focos de incêndio. De acordo com a plataforma MapBiomas, o mês de agosto representou quase metade da área queimada do Brasil em 2024. E o total de área queimada em agosto desse ano foi praticamente três vezes maior se comparada a 2023. É um dado alarmante.

O mês de setembro tampouco foi alentador nesse sentido. Foram batidos novos recordes de focos de incêndio, que ultrapassaram 2.500 só no Estado de São Paulo. O recorde anterior era de 2020. E o Estado praticamente todo está em nível de emergência máxima ou alerta para riscos de incêndio agora, no começo de outubro.

Os danos e problemas decorrentes desse cenário são os mais diversos, inclusive para os que vivem nos centros urbanos. A cidade de Barretos, nossa vizinha, está há 160 dias sem chuvas, tendo sido decretado estado de emergência e calamidade pública pelo governo do Estado de São Paulo.

Os prejuízos financeiros são elevadíssimos. Até o momento, entidades representativas do setor estão calculando um prejuízo próximo aos R$ 15 bilhões só no período de junho a agosto, em virtude da seca extrema e das queimadas. No trágico episódio das enchentes do Rio Grande do Sul no primeiro trimestre, estimativas ultrapassaram os R$ 21 bilhões em danos patrimoniais. E não raro os valores efetivos dos prejuízos são maiores que os estimados, e dificilmente é possível contabilizá-los de forma precisa, pelas dificuldades inerentes a desastres dessa ordem de grandeza.

Não bastasse, eventos climáticos extremos tendem a causar grandes problemas de saúde a uma parcela significativa da população. No caso das enchentes do RS, leptospirose, dengue, hepatite, desnutrição, tétano, diarreia, e doenças respiratórias estiveram no foco dos profissionais de saúde durante o atendimento às vítimas.

As doenças respiratórias, aliás, são elementos comuns às vítimas de estiagem e queimadas, como estamos enfrentando, atualmente. Há uma infinidade de pessoas com problemas respiratórios na região em virtude da baixa qualidade do ar, desde H1N1, influenza, vírus sincicial respiratório e a famigerada covid.

Os problemas causados pelas mudanças climáticas não se limitam às florestas e aos campos. Estão batendo às portas da cidade. Estamos sentindo a secura no ar, e vendo o fogo chegar nos limites urbanos.

É urgente pensarmos em ajustes nas nossas relações com os recursos naturais e nossos estilos de vida. Governos e empresas estão há um bom tempo olhando para medidas de mitigação e fiscalização. Mas, enquanto sociedade, só conseguiremos resultados positivos e significativos se conseguirmos propagar boas mudanças em escala.

Nós, cidadãos, também temos nossa responsabilidade. Compete-nos consumir com moderação – principalmente a água! –, preocuparmo-nos com a geração de resíduos (o plástico é um dos maiores problemas do século XXI) e seu descarte mais adequado possível, e usar energia de forma mais racional, sem desperdícios. Já será um grande começo.

(Colaboração de Gabriel Burjaili, advogado e professor, bebedourense).

Publicado na edição 10.878, de sexta a terça-feira, 4 a 8 de outubro de 2024 – Ano 100