
A Amazônia é uma preocupação mundial. Todos sabem que ela é fundamental para a saúde climática do planeta. A Mata Atlântica, por abrigar a maior parte da população brasileira, tem até uma lei especial, além de ter sido contemplada na Constituição Ecológica (era assim chamada quando promulgada, por causa do pioneirismo de seu artigo 225). Já o cerrado, pobre coitado, não parece merecer tanta atenção. Por isso mesmo, a destruição prossegue à toda. Em 2022, o desmatamento cresceu praticamente trinta por cento em relação a 2021, de acordo com o sistema Prodes do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Perdeu quase onze mil quilômetros quadrados de vegetação entre agosto de 2021 e julho de 2022. Foi o terceiro ano seguido de aumento do desmate. No último quatriênio, a área perdida foi superior a trinta e três mil quilômetros quadrados, o que equivale a seis vezes a área de Brasília.
A responsabilidade por esse extermínio é do festejado Mapotiba – Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Sozinhos, causaram setenta e um por cento de eliminação de cobertura vegetal. O Maranhão liderou e em seguida Bahia, Tocantins e Piauí.
Poucos dão valor a essa área de savana tropical, que abriga mais de cinco por cento da biodiversidade mundial e vinte e cinco milhões de pessoas, cem povos indígenas e comunidades tradicionais. É o bioma de menor proteção no ambiente brasileiro. Somente doze por cento dele está em Unidades de Conservação e em Terras Indígenas. O famigerado diploma de 2012, que alguns chamam lei Florestal – que não se utiliza uma única vez dessa expressão: “Código Florestal” – permite que até oitenta por cento das áreas possam ser utilizadas para a agricultura e pecuária. A esperança é que o mercado internacional interrompa a aquisição de produtos provenientes de áreas desmatadas. A União Europeia já acordou em vedar a compra de soja, carne bovina, madeira, cacau, óleo de palma e café, se não houver prova de uma cadeia ecológica na sua produção.
Espera-se que a economia conscientize os agricultores e pecuaristas brasileiros de que preservar é mais lucrativo do que explorar a terra para soja e depois usá-la como pasto, a caminho da desertificação. O bolso é o melhor argumento para quem só raciocina a partir de cifrão.
Crianças em perigo
Elas nada fazem para piorar o mundo. Mas o pior dos mundos está reservado para elas. O relatório Crianças, adolescentes e mudanças climáticas no Brasil, publicado pela UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância, publicado em novembro de 2022, deveria apavorar todas as pessoas de bem. Mas vai passar desapercebido, como todos os alertas que vozes minoritárias, a clamar no deserto das consciências, têm desaguado na insensibilidade.
O que contém esse estudo? Mostra que mais de quarenta milhões de brasileiros com até dezoito anos estão expostos a mais de um risco ambiental. Quais são os tipos de risco? O pior deles é a poluição por pesticida, que atinge quase trinta milhões de crianças e adolescentes. Em segundo, a poluição do ar, com quase vinte e cinco milhões de jovens brasileiros expostos. Depois, as ondas de calor, com aproximadamente catorze milhões de infantes e moços ameaçados. Mas há também falta de água, que impacta cerca de nove milhões de vítimas, as enchentes fluviais, que podem atingir sete milhões e meio de seres vulneráveis e mais dois milhões sujeitos a enchentes costeiras.
O resultado deriva de estudos fornecidos pelo Unicef, artigos e relatórios de entidades brasileiras e internacionais, com o intuito de se chegar a um diagnóstico da situação climática e ambiental no Brasil. A partir do foco centrado em crianças e adolescentes.
A contaminação por pesticidas, disseminados no ar e na água, compromete o desenvolvimento físico e intelectual desses seres em formação. É inacreditável que o Brasil aceite mais de quinhentos herbicidas proibidos em seus países de origem, aqui livremente utilizados por insanos que só enxergam o lucro e não se preocupam com a saúde alheia.
O desaparecimento de muitos cursos d’água, a eliminação de nascentes que eram abundantes no Brasil antes da chegada lusa, tem sido assimilado por governo e pela sociedade como fatos naturais. Não são! Representam a consequência dos maus tratos infligidos à natureza, nosso maior patrimônio, dilapidado e destruído em grande parte, por insensatez, ignorância e cupidez. Pobres crianças, cujo destino está selado pela crueldade adulta sem freios, nem piedade.
(Colaboração de José Renato Nalini, Diretor-Geral da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras).
Publicado na edição 10.731 – De sábado a terça-feira, 4 a 7 de fevereiro de 2023