O mundo em chamas

José Renato Nalini

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De que adiantam reuniões internacionais em defesa do ambiente, prolífica produção normativa que inclui a mais bela norma constitucional produzida no século XX, o artigo 225 da Constituição Cidadã e vasta tonelagem infraconstitucional, se o bicho-homem não tem juízo?

Os acordos internacionais prometem redução na emissão de gases venenosos, causadores do efeito-estufa. Mas o uso dos combustíveis fósseis continua alto. E a pesquisa para encontrar mais petróleo encontra as ambiguidades de quem se proclama amigo da natureza, mas quer também explorar essa fonte poluidora, que vai causar o desaparecimento de qualquer modalidade de vida neste sofrido planeta.

A Terra se cansou de emitir sinais de advertência. Ela pensava que o homem fosse amigo dela. Que se compenetrasse de que a existência é uma cadeia de elos que não podem ser rompidos, sem que impactos devastadores fossem desencadeados. O ser humano desaprendeu de ser biófilo, ou seja, amigo da vida. Preferiu ser amigo da morte.

É isso o que explica a destruição da Amazônia, do Cerrado, do Pantanal, da Mata Atlântica. Os números são assombrosos. Inimaginável que um país tivesse a coragem de destruir seu mais valioso patrimônio, antes mesmo de conhecê-lo e de explorar suas potencialidades.

Por isso é que a Terra hoje parece um grande incêndio. As altas temperaturas não deram trégua no verão do Hemisfério Norte. Nos Estados Unidos, incêndio florestal destruiu uma cidade no Havaí, convertendo-a em amontoado de cinzas. Europa e Canadá também tiveram incêndios temíveis. O inverno brasileiro de 2023 foi o mais quente dos últimos quarenta anos. E isso vai continuar, enquanto continuar a nossa teimosia em não cuidar do planeta, assim como ele merece e espera.

O pior é que todos sabem o que devem fazer. Pensar globalmente, agir localmente. Plantar uma árvore. Não desperdiçar. Exigir responsabilidade dos governos. Reciclar. Poupar água. Tudo perfeitamente possível, para quem não perdeu o mínimo de consciência ecológica, sem a qual pereceremos muito antes do que poderíamos imaginar.

O que você está fazendo para salvar a Terra e as próximas gerações?

POR QUE NÃO FAZER?

O mundo está ameaçado pelas mudanças climáticas e pouca gente se propõe a fazer algo para mitigar as dramáticas consequências disso, a cada momento mais próximas. Entretanto, é possível reagir, ainda que pareça pouco a ação individual, diante da dimensão do problema.

Os bons exemplos existem e precisam ser disseminados. Um dos excelentes frutos da Constituição Cidadã de 1988 foi fomentar a formação de grupos do Terceiro Setor. A convicção de que o Estado não é capaz de resolver todas as questões e que o governo está a serviço da cidadania, a única titular da soberania. Ao menos, do que sobrou dela na profunda mutação geopolítica que a humanidade sofreu nos últimos tempos.

Assim, inúmeras entidades atuam na mudança do panorama ambiental e fazem a diferença essencial diante da inércia de tantos.

Em Jaguariúna duas iniciativas interessantes. A OSCIP “Trilhos do Jequitibá”, em parceria com a Associação Carisma, recolhem o alimento desperdiçado e, junto com galhos secos, fazem compostagem. A técnica de trituração dá resultados e não precisa de grande espaço. Os sacos de adubo são vendidos para a agropecuária da região e o valor obtido é revertido para a manutenção da Carisma, que abriga quase cinquenta assistidos.

A compostagem é parte do processo de recuperação de seres humanos que foram tragados pela droga. Ao mesmo tempo, dá-se finalidade útil ao desperdício de alimento, algo muito comum na realidade brasileira. Nas empresas, o descarte de alimento chega até a meio quilo por pessoa, a cada dia. Quando essa comida desperdiçada é triturada, ela se transforma em biomassa que pode servir como “vaso orgânico”. Contém nutrientes suficientes para auxiliar a germinação de qualquer planta.

Cada empresa responsável poderia contar com um triturador próprio e ajudar a natureza a se preservar de maneira ecologicamente correta.

Além disso, a “Trilhos do Jequitibá” desenvolveu um projeto chamado “Eu vejo flores em você”. Consiste em plantar crotolaria, um arbusto que produz flores atraentes para libélulas. Estas se alimentam das larvas e do mosquito Aedes aegypti adulto, transmissor da dengue.

São formas factíveis de promover o desenvolvimento sustentável, mediante atividades de cunho artístico, cultural e lúdico. E você, o que está fazendo pelo ambiente de sua rua e de sua cidade?

(Colaboração de José Renato Nalini, Reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras).

Publicado na edição 10.799, de sábado a quarta-feira, 28 de a 1º de novembro de 2023