Quer liderar? Então aprenda

José Renato Nalini

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É natural o anseio a liderar, em vez de ser liderado. As pessoas que estudam e se preparam para a renhida luta existencial, querem ser ouvidas, respeitadas, seguidas. Mas a absorção de informações, colecionar dados, decorar teoria, é muito pouco para garantir o exercício da liderança.

Um líder não é aquele que se impõe pela autoridade. Pela excessiva rigidez. Pela imposição de uma disciplina que só prospera em virtude da sua posição hierárquica. Um líder é alguém predestinado a seduzir as pessoas com as quais trabalha, fazendo-se alvo de consideração, não por seu poder de mando, mas por seu talento em cativar.

É muito raro que a educação formal, tão negligenciada em seus aspectos socioemocionais, se devote à preparação de lideranças. O mundo está em transição e para obter um lugar que gere satisfação íntima e também seja relevante para o aprimoramento do convívio, o líder – ou o candidato a sê-lo – deve empenhar-se por iniciativa própria na procura de caminhos viáveis.

Os desafios da liderança moderna reclamam que o líder seja flexível. Precisa ajustar o seu estilo às necessidades individuais de cada integrante de sua equipe. Deve formar relacionamentos calcados em empatia e não desconhecer emoções. Lembrar que todo ser humano tem alguma qualidade que deve ser lapidada, enquanto que as arestas devem ser trabalhadas para não atrapalhar o percurso laboral.

Um líder vai compreender a natureza das preocupações de seus liderados. Assumirá o papel de um fomentador das potencialidades de cada integrante de seu grupo. Um líder é alguém que precisa gostar de pessoas. De qualquer pessoa, de ser humano em suas múltiplas formatações. Lembrar-se de que as criaturas racionais são singulares, heterogêneas e irrepetíveis. Mesmo os gêmeos univitelinos são diferentes, não idênticos.

Atender ao comando de metas e indicadores é insuficiente para garantir um clima de geral crescimento do ambiente de trabalho. O bom líder detecta a vocação de cada liderado e o incentiva a prosseguir. E, o principal, ter na consciência a relevância de seu papel. Uma frase estranha, algo que possa vir a ser interpretado erroneamente, causa males duradouros e insuscetíveis de serem identificados de imediato.

Por isso, quem pretende liderar, tem de aprender a fazê-lo de forma adequada. Com humildade, perseverança e muito respeito pelo semelhante.

Mais tolerância, minha gente!

Vive-se uma era de ira e intolerância. Todos têm nítida noção de seus direitos, nem sempre de suas obrigações. Julga-se o próximo como o Tribunal da Inquisição e perdoa-se qualquer falta própria, seja qual for a sua dimensão. Entretanto, uma sociedade humana se destina a propiciar a todos o integral desenvolvimento de suas potencialidades, até que a integralidade das criaturas atinja a plenitude possível.

Conviver é perdoar. É relevar as falhas, que não são exclusivamente alheias, mas também são nossas. Os indivíduos bem formados até compreendem esse discurso. Querem ser exemplos éticos, quase perfeitos, longe da podridão dos demais. Só que a turba é surda à ponderação e inimiga da prudência. Leva ao patíbulo sem titubear. À menor suspeita assume feições de polícia investigativa, polícia judiciária, Ministério Público e Poder Judiciário.

É um daqueles paradoxos de que se impregna a humanidade. Um discurso, outra prática. Proclamação edificante, conduta miserável. Ninguém escapa a esse tribunal implacável, o do leviano julgamento pelos coetâneos. Dante, o incomparável artista, católico e florentino, sabia disso, tanto que escreveu: “Fastidium etenim est in rebus manifestissimis probationes adducere”, ou “É coisa enfadonha querer demonstrar o que é bastante claro”. E não escapou à maledicência.

Quando Giovanni Papini se propôs a escrever “Dante Vivo”, para resgatar o ser humano, e não o cultuado autor da “Divina Comédia”, ocupou-se das fragilidades e dos vícios de seu personagem, lembrando que é justamente isso o que o aproxima de nós e o torna irmão nosso.

Correta a assertiva de que “Em cada homem, grande ou pequeno, há uma mistura, como dizia o poeta, de fogo e esterco. Porém, só poderão ser grandíssimos, como Dante, aqueles homens que souberam livrar-se dos elementos ignóbeis ou souberam queimá-los para tornar mais viva a chama”.

E nós todos, assumamos com humildade nossas falhas para, antes de nos posicionarmos quais carrascos do próximo, primeiro nos indaguemos qual a nossa capacidade de compreender, tolerar e perdoar aquilo em que também poderíamos incorrer.

A intolerância fere o semelhante, mas transmite imagem nossa muito diversa daquela que costumamos nutrir a respeito de nós próprios. Para conforto nosso, é mais conveniente começar a cultivar uma dose especial de tolerância.

(Colaboração de José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário-geral da Academia Paulista de Letras).

Publicado na edição 10.828, quarta, quinta e sexta-feira, 13, 14 e 15 de março de 2024