Um Papa verde e atento

José Renato Nalini

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Depois da “Laudato Si” (Louvado Seja), o Papa Francisco divulgou a Exortação Apostólica “Laudate Deum” (Louvado seja Deus), sobre transição energética. Para o Pontífice, “Cabe esperar apenas formas vinculantes de transição energética que tenham três características: que sejam eficientes, que sejam obrigatórias e que possam ser facilmente monitoradas”.

É mais um fabuloso tento do Chefe da Igreja Católica, atento às mudanças climáticas e que tem autoridade para chamar as lideranças mundiais que são negligentes no trato dessa relevantíssima questão.

Desde o início de seu pontificado, Francisco se mostrou ser “O Papa Ecológico”. Não por coincidência, ao adotar o nome do “Homem do Milênio”, Francisco de Assis, mostrou que estaria atento ao ambiente. O “Pobrezinho de Assis” chamava todas as criaturas como irmãs, inclusive a “Irmã Natureza”. Postura muito mais edificante e racional do que o egoísta antropocentrismo que legitima a destruição de todos os ambientes.

Boa notícia é a de que o Papa vai participar da COP28, um acontecimento inédito desde o início dessas reuniões, em 1995. Ele está muito preocupado com a leniência dolosa da maior parte dos governos: “Ainda temos tempo de impedir isso. o nosso futuro está em jogo, o futuro dos nossos filhos e dos nossos netos. É necessário um pouco de responsabilidade”.

No dia 4 de outubro, fez apelo aos negacionistas da mudança climática e a políticos relutantes sobre o maior perigo que ronda a humanidade. Ele diz: “Será uma grande decepção o fracasso em Dubai. Colocará em risco tudo de bom que foi alcançado até agora. O planeta pode estar chegando ao ponto de ruptura”.

Os católicos sabem que Jesus Cristo prometeu estar com sua Igreja até o final dos tempos. Um Papa que se preocupa com o caos que se avizinha é mais um recado da Providência de que, se o homem não tiver juízo, a Terra não vai hesitar em continuar pelo cosmos, mas já sem a presença destruidora desse animal tão irracional.

Ah! Insensatez!     

Jane Goodall, a primatóloga e conservacionista inglesa que esteve recentemente em São Paulo advertiu: “Não somos imunes à extinção!”. Isso porque a humanidade insiste em continuar a se utilizar de combustíveis fósseis e a fazer prospecção em áreas que deveriam permanecer intocadas.

Está chegando o momento do não retorno. “Se nós não mudarmos, nos unirmos e começarmos a fazer as coisas de maneira diferente chegará o dia em que será tarde demais. Chegaremos ao ponto de não retorno da destruição ambiental. E, se nos importarmos com nossos filhos e os filhos de nossos filhos, então é hora de tomarmos uma atitude”.

Mas as atitudes que governos tomam são sempre no interesse imediato de colheita de frutos e dividendos dessa democracia formal. É para alavancar a matriz da pestilência chamada reeleição.

A primatologista, com 89 anos, é uma verdadeira amiga da natureza. Interessou-se por tudo e se fixou no estudo dos chimpanzés nas florestas da Tanzânia. Verificou que eles desapareciam e buscou melhores condições para a vida das pessoas que também viviam onde os animais viviam e que são questões dialogais. Quando uma espécie desaparece, põe em risco a existência das demais. Tudo é uma corrente cujos elos não podem ser rompidos.

Continua a batalhar pela preservação do ambiente e diz que sua próxima grande aventura é a morte, para descobrir o que acontece depois. Ela tem esperança numa outra fase da existência. Tanto que escreveu a obra “O Livro da Esperança”, para animar infância e juventude a se tornarem guardiões do que ainda resta e que a insensatez do bicho-homem faz com que desapareça rapidamente.

Não custa recordar: não é a Terra que corre perigo. É a vida. O planeta poderá continuar a existir. Mas prescindirá da espécie humana para isso. Só que a ignorância e a ambição não deixam a cegueira do mundo enxergar o que é óbvio. Muitas mortes ainda serão causadas pelo mau uso do petróleo, pela derrubada do que resta de verde, pela poluição generalizada de terra, água e ar. Ah! Insensatez! Até quando?

(Colaboração de José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário-geral da Academia Paulista de Letras).

Publicado na edição 10.821, de sábado a terça-feira, 17 a 20 de fevereiro de 2024