
Qual é, para você, a mais bela palavra em português? Os que falam inglês escolheram a sua. Depois de convidar mais de quarenta e duas mil pessoas dos cento e dois países que usam o inglês como idioma, a escolherem a mais bela palavra, chegou-se ao resultado “Mother”. Mãe!
Os promotores dessa campanha estranharam que a palavra “Father”, pai, não apareceu entre as setenta mais votadas.
Constatou-se também que as dez primeiras colocadas nesse ranking tão subjetivo, tão pessoal, refletem bons sentimentos. A segunda foi “Passion”, (Paixão), a terceira “Smile” (Sorriso), a quarta “Love” (Amor), a 5 “Eternity” (Eternidade), a sexta “Fantastic” (Fantástico), a sétima “Destiny” (destino), a oitava “Freedom” (Liberdade), a nona “Liberty” (também Liberdade) e a décima “Tranquility” (Tranquilidade).
O resultado geral foi positivo e otimista. Pois em décimo primeiro lugar veio “Peace” (Paz), em décimo terceiro “Sunshine” (Brilho do sol) e “Hope” (Esperança), da qual se esperava melhor performance, apareceu em décimo oitavo.
Boa amostragem do que pensam os que se exprimem no idioma inglês. Não são as palavras mais utilizadas, ou as palavras da moda, que nos levariam a Inteligência Artificial, Metaverso, Disrupção, Cancelamento ou quaisquer outras. São aquelas que, no nosso sentir, exprimem mais beleza. Constaram da relação das mais votadas abóbora (quadragésimo lugar), banana (quadragésimo primeiro) e coco em quinquagésimo quarto. Animais compareceram com borboleta, que em inglês é a linda “butterfly”, em trigésimo primeiro, abelha (44º), canguru (50º) e hipopótamo (52º).
No departamento esquisitice, figuram guarda-chuva, gazebo, soluço e fuselagem. É interessante verificar como a palavra, esse instrumento mágico, que pode ferir e matar, mas pode salvar e enlevar, sugere sentimentos e sensações a quem dela se sirva para se comunicar.
O Conselho Britânico, patrocinador dessa enquete, estranhou que “mãe” fosse a palavra mais bela. Numa pesquisa anterior, realizada pela Enciclopédia Encarta, em 2000, a vencedora foi “Serendipity”, a capacidade de descobrir coisas por acaso. Nesta última, esteve na vigésima quarta colocação.
E nós, em português? Qual seria a nossa escolha?
Patriotismo é utopia?
O filósofo Luc Ferry lamentava a perda de patriotismo na França. Dizia que em seu tempo de ensino fundamental, se a professora indagasse quem morreria pela Pátria, a unanimidade dos alunos se levantaria e responderia “Sim”.
Hoje, se idêntica pergunta for feita, merecerá indiferença ou deboche. Desapareceu o amor à Pátria. Substituído por ira fanática, agressões verbais e físicas, invocação a símbolos inspiradores de violência e intolerância.
Entretanto, o sentimento de amor à Pátria já se manifestou de forma ardorosa em São Paulo, com as primeiras turmas das Arcadas, a Faculdade de Direito criada em 1827 e instalada em 1828.
Eram apenas duas as escolas jurídicas no Brasil: Olinda e São Paulo. Hoje, o país tem mais Faculdades de Direito do que a soma de todas as demais, espalhadas pelo restante do planeta. Por isso é que o Brasil é a terra em que a Justiça impera e inspira.
Quando os bacharéis, depois de cinco anos, deixavam São Paulo para voltar à sua província natal, despediam-se chorando, porque haviam se afeiçoado a Piratininga. E deixavam registrado esse amor. Um exemplo: Lúcio de Mendonça, no texto “Adeus a São Paulo”, publicado em “A Província”, que antecedeu o “Estadão”, louvava a terra onde aprendera o que significa liberdade. E dizia que o planalto paulistano era tão alto, “que de lá se avista o futuro do Brasil inteiro”. Confessava que em São Paulo “nutri-me do pão dos fortes, enrijei-me às auras vitais daquela terra; bebi a longos sorvos o seu alento vigoroso; aqueci o peito ao calor do seu peito de gigante; penetrei-me da sua energia selvagem; verme, senti arrojos de água; encarei de face com o sol; antevi, em sonhos grandiosos, o largo destino da pátria republicana e, no solo paulista, tive orgulho de ser brasileiro”.
Quem é que hoje tem coragem de repetir, ainda que com outras palavras e no estilo da época, sentimento de idêntica intensidade em relação ao seu solo natal? O ensino do direito está ensinando também o amor à Pátria, o amor à cidade em que se nasceu, o amor à origem e à história de nosso país?
(Colaboração de José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras).
Publicado na edição 10.813, quarta, quinta e sexta-feira, 17, 18 e 19 de janeiro de 2024