
Um evento não tão imprevisível, porém bastante surpreendente foi a contaminação recente do presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump, do Partido Republicano, pelo vírus Covid-19, da família dos Coronavírus e responsável pela maior pandemia global dos últimos cem anos. A contaminação atinge em cheio um político e líder mundial que até então minimizava os efeitos da pandemia, justamente no período mais tenso e crucial da campanha presidencial naquele País.
A escolha do 45º presidente dos EUA será definida no próximo dia 3 de novembro, e as pesquisas de intenção de votos até aqui promovidas indicam vantagem à Joe Biden, o candidato do Partido Democrata, na corrida presidencial, vantagem essa substancial a depender da região em que coletadas as opiniões – com ligeira, quase mínima vantagem para Trump em alguns estados do sul dos EUA – ou o gênero, a faixa etária, a raça ou a origem do eleitor questionado – há clara predileção das mulheres, jovens, negros e hispânicos pelo candidato do Partido Democrata.
A contaminação do atual mandatário na reta final da campanha retira, inegavelmente, do candidato à reeleição, a força de mobilização necessária para sua confirmação a mais quatro anos à frente da maior potência econômica e militar do planeta. A necessária saída de cena do candidato Trump por motivos de saúde, ainda que por alguns dias, reduz a movimentação de seu eleitorado mais cativo em busca da reeleição e confere menos tempo e esforços à Trump para o convencimento dos eleitores indecisos. Vale destacar que nos EUA o voto é facultativo, razão pela qual os candidatos não só precisam convencer os eleitores sobre suas propostas como, também, precisam mobilizar tais eleitores a votar, o que, convenhamos, não é uma tarefa fácil em tempos de descrença com a classe política.
No mais, a rápida saída do candidato Trump do hospital, caminhando e demonstrando, ao menos por alguns minutos, sinais de pretensa força e recuperação, pode aumentar os riscos não apenas à saúde do atual presidente e postulante a mais um mandato, como também de seus assessores e de seu entorno político e pessoal, ignorando as recomendações por isolamento e repouso. Tal atitude, boa politicamente, porém questionável sob o ponto de vista da sociedade, passa à população uma imagem de certo desdém em relação às recomendações de saúde em plena pandemia. Vale ressaltar que Trump tem 74 anos e Biden, seu rival na disputa presidencial, tem 77, e ambos, já idosos, estão no chamado “grupo de risco” da Covid-19. Todo cuidado é pouco, seja com a saúde de ambos, seja em relação aos exemplos dados aos eleitores e ao País.
Neste contexto, é interessante notar que a Covid-19 alterou a rota da campanha presidencial em seu momento mais crítico, isto é, faltando apenas poucas semanas para a eleição. Hoje, a campanha nos EUA é marcada por maior retórica de ambos os candidatos, especialmente Donald Trump, por uma menor exposição dos candidatos ao público e aos seus eleitores – o chamado “corpo a corpo” é uma estratégia poderosa de campanha – e por uma menor mobilização do público interessado na disputa. Desta forma, as campanhas de ambos os candidatos têm hoje por estratégia uma guerra de discursos e apelos a questões não relacionadas diretamente ao País, com ataques pessoais e questionamentos pouco relevantes para o futuro da Nação. Isso o faz lembrar de alguma campanha recente no Brasil, leitor?
Em suma, é importante estarmos de olho nos desdobramentos da eleição presidencial norte-americana, vez que o resultado do pleito importa não apenas aos cidadãos dos EUA como, também, a todas as demais pessoas no mundo, face à grande influência norte-americana na política, na economia e na manutenção – ou quebra – da paz e da diplomacia mundial. Um simples vírus pode alterar o curso de toda uma geração.
(Colaboração de José Mário Neves David, advogado e administrador de empresas. Contato: [email protected] ).
Publicado na edição nº 10525, de 10 a 16 de outubro de 2020.