Crianças geneticamente modificadas, mais do que um desejo!

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A década de 2000 foi marcada pela polêmica dos organismos geneticamente modificados. Ao seu início (entre 2002 e 2003) falou-se muito dos alimentos transgênicos, em especial da soja, que começava a se insinuar nos campos de cultivo brasileiros. À época o Brasil – produtores, consumidores e pesquisadores – ainda não haviam despertado para o assunto, mas algumas organizações não governamentais como o Greenpeace já alertavam para o problema, ressaltando os malefícios para a saúde da terra e dos seres humanos. Atualmente o Brasil é um dos maiores produtores de grãos transgênicos do mundo, bem como um potencial consumidor. A despeito do decreto federal de 2003 que obriga aos fabricantes rotular os alimentos cujo teor de matéria transgênica ultrapassa 1% de sua composição total, não se vê nas embalagens dos produtos o cumprimento ao direito garantido (sic!) do consumidor. Parece que passaram um mata-borrão sobre o assunto.
Entre 2006 e 2007 as pesquisas sobre transgenia miraram um novo alvo. Desta vez, os animais. Camundongos, ratos, coelhos, porcos, ovelhas, cabras, galinhas, macacos e vacas, entre várias outras, fizeram parte de um rol de espécies mutantes advindas da manipulação genética dentro dos laboratórios de pesquisa, principalmente das indústrias farmacêuticas, que se utilizam desses animais para testar novos medicamentos em tempo mais curto.
Em paralelo, ainda na área da saúde, devido à enorme fila de pacientes esperando por transplantes de órgãos, muitos pesquisadores se debruçaram sobre a questão do xenotransplante, ou transplante de órgãos e tecidos de animais em seres humanos. Os porcos transgênicos são exemplos vívidos. Estão sendo criados com marcadores humanos para que o organismo receptor não rejeite a parte transplantada. Talvez seja a nova pedra filosofal da medicina.

Seres humanos, a fronteira final
Peter Ward, paleontologista americano e professor na Universidade de Washington, publicou um ensaio na revista Scientific American em 2009 que tratava sobre o futuro do Homo sapiens. Um dos destaques do artigo dizia sobre a seleção artificial, em que pesquisadores dirigiam a evolução do ser humano pela manipulação genética.
Existem duas formas conceituais de mudar o gene das pessoas: alterando os genes apenas do órgão relevante (terapia gênica) ou alterando o genoma inteiro de uma pessoa (terapia germinal). Atualmente a luta da transformação para curar doenças se dá pela terapia gênica, o que já não é nenhum trabalho trivial. É importante observar que um gene pode desempenhar mais de uma função no corpo, e uma função pode ser desempenhada por mais de um gene. Alterações podem provocar consequências indesejadas.
Mas, quem serão os pais que tendo a oportunidade, não escolherão ter um filho inteligente, com beleza inigualável, talentoso para a música e desenvolvido para o esporte? Ou quem sabe evitar o caráter desonesto, depressivo ou mesmo criminoso da criança?
Por outro lado, estudos recentes insinuam que o envelhecimento é um mero desgaste do corpo ou de suas partes, cuja deterioração é programada pelos genes. Destravando esses genes e reprogramando-os, os seres humanos poderiam chegar aos 150 anos completamente sadios. Não é tentador?
Ward insinua, ao final do ensaio, que o próximo século os seres humanos serão capazes de criar novas espécies humanas, fato reservado tão somente à natureza. Mas, partindo da recente história da transgenia vegetal e animal e de sua exorbitante evolução nos últimos 15 anos, não será surpresa se em poucas décadas nós nos depararmos com notícias que darão conta desse nível de criação, a despeito das limitações técnicas e culturais impostas pela própria sociedade. Nós provavelmente não testemunharemos, mas nossos descendentes diretos certamente viverão sob uma nova filosofia em que seres humanos farão frente à divina natureza na criação de novos seres.

(Colaboração de Wagner Zaparoli, natural de Bebedouro, doutor em Ciências pela USP, mestre em Ciência da Computação, professor de lógica e consultor. E-mail: [email protected]).

Publicado na edição n° 9414, dos dias 19 e 20 de junho de 2012.