Reforma tributária: vem mais por aí

José Mário Neves David

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Nem bem caminhou no Congresso Nacional, a reforma tributária ainda tem um longo caminho pela frente. Recentemente aprovada em duas votações na Câmara dos Deputados, conforme estabelece a Constituição Federal em relação às alterações promovidas no texto constitucional, a matéria será analisada a partir de agosto, pelo Senado Federal. Caso aprovada, também em duas votações, a Proposta de Emenda à Constituição 45/2019 (PEC 45), que personifica a tão propalada reforma tributária em curso, deverá ser sancionada pela Presidência da República para entrar em vigor. Cabe aguardar e verificar qual será a velocidade da tramitação do texto no Senado Federal, se haverá ou não alguma alteração na redação, se o texto será sancionado integral ou parcialmente, dentre muitas outras variáveis.

Como já amplamente divulgado, a reforma tributária em curso, mais especificamente a da PEC 45, visa alterar as regras da tributação do consumo no país. Cinco tributos, sendo três federais (IPI, PIS e Cofins), um estadual (ICMS) e um municipal (ISS), estes dois últimos também de competência do Distrito Federal, poderão ser substituídos por três: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência da União; o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), sob a batuta dos estados e municípios; e o Imposto Seletivo (IS), de responsabilidade também da União. Caso aprovado o texto da PEC 45 nesse modelo, haverá uma ampla reforma sobre a forma de incidência de tributos sobre o consumo do brasileiro.

Um ponto importante a respeito da reforma tributária até aqui debatida é que, conforme mencionado, ela, muito embora complexa e de difícil aprovação pelo Congresso Nacional, altera apenas a tributação sobre o consumo. Um mundo de operações e fatos geradores – ou hipóteses de incidência – da tributação no Brasil ainda está de fora das proposições do texto da PEC 45. O melhor exemplo dessa “ausência” é a inexistência de modificações sobre a tributação da renda, talvez a fonte mais generosa de arrecadação da União e responsável pela maior fatia das receitas do Estado brasileiro.

É bem possível que alterações na tributação da renda no Brasil voltem à carga tão logo a PEC 45 caminhe no Senado Federal. Conforme declarações do Ministro da Fazenda, é provável que se aguarde primeiro a aprovação da reforma da tributação sobre o consumo para, então, ser dado o foco sobre as modificações pretendidas sobre o Imposto sobre a Renda das pessoas físicas e jurídicas. Porém, como a velocidade da política é imprevisível, estando a evolução da aprovação da PEC 45 sujeita a muitas variáveis, e dada a necessidade de reforço de caixa da União face aos constantes aumentos de gastos da máquina pública e do necessário controle do déficit do país, nada impede que eventuais mudanças sobre a tributação da renda sejam propostas antes mesmo da provável implementação da CBS, do IBS e do IS.

Qualquer previsão, no momento, é mero exercício de futurismo, mas, considerando as propostas de alterações legislativas já apresentadas, as declarações de integrantes proeminentes do governo federal, o histórico das pautas do grupo político que ocupa atualmente o Poder Executivo federal e as características da tributação sobre a renda no Brasil, é possível que alguns flancos específicos dessa seara sejam atacados: a volta da tributação sobre a distribuição de dividendos aos sócios de pessoas jurídicas; a implementação da tributação sobre os rendimentos e o “estoque” de patrimônio dos fundos de investimentos exclusivos; e eventuais alterações na legislação da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), especialmente sobre alguns setores específicos da economia.

Dessa forma, verifica-se que a reforma tributária em curso, sobre a qual se lê a todo o tempo nos jornais e se assiste ininterruptamente nas telas, representa apenas uma parte das modificações planejadas sobre o sistema tributário nacional. Novas alterações poderão ser propostas nos próximos meses em relação a outras frentes de tributação no Brasil, tais como a renda das famílias e das organizações. Assim, é importante que todos estejam atentos às movimentações políticas que deverão ocorrer no segundo semestre de 2023, já que todos, sem distinção, serão impactados por eventuais modificações nas normas que regem como são tributados os brasileiros.

(Colaboração de José Mário Neves David, advogado e consultor. Contato: [email protected]).

Publicado na edição 10.774, sábado a terça-feira, 22 a 25 de julho de 2023 – Ano 99