“O ser humano é um animal político”, como bem delimitou Niccolò Maquiavel em sua obra-prima “O Princípe” (1532), base da ciência política contemporânea. Em outras palavras, o famigerado autor procurou demonstrar – e conseguiu, com maestria – que todos nós, queiramos ou não, somos seres sociais voltados à arte do convívio e do relacionamento com outras pessoas, visando a obtenção de resultados e objetivos previamente planejados.
A política é, portanto, uma característica inata do ser humano, quase uma condição para a harmonia do coletivo, porém o termo, ao longo dos tempos, foi estigmatizado e depreciado, sendo equivocadamente associado a algo negativo, ao compadrio, à torpeza. Devemos repensar essa questão.
O estudo da história indica que a humanidade passou por inúmeros conflitos, guerras, crises e perturbações até chegar ao estágio atual. Muito embora não pareça, especialmente no Brasil, vivemos em tempos de duradoura paz no mundo quando comparamos o estágio atual da civilização com períodos de um passado até então não muito distante. As guerras, nos últimos setenta anos, são pontuais e isoladas, exceções e não a regra. Desenvolvemos, ao longo do tempo, o hábito de negociar, debater, ao invés de simplesmente nos atacarmos.
A diplomacia tomou o lugar do embate, e esse avanço civilizatória da paz, cumulado a outros acontecimentos, tais como a redução da miséria extrema, o desenvolvimento de medicamentos e a expansão de medidas básicas de higiene e saneamento, dentre outras questões, contribuiu sobremaneira para o progresso da humanidade. Esse diálogo civilizatório é fruto da política, do debate e da conversão de ideias. A política, essa incompreendida, venceu a barbárie dos velhos tempos dos nossos ancestrais e nos trouxe, de certa forma, em segurança até aqui, ainda que o mundo lá fora seja, ainda e infelizmente, perigoso e, em certa medida, cruel.
Nesse contexto, fica clara nossa percepção de que o convívio e o relacionamento com as outras pessoas em busca de um bem comum, isto é, a paz, permitiu que a humanidade progredisse e caminhasse rumo a novos e promissores tempos. Isto é política pura! Aquela política que assistimos na TV, às vezes, com certa repulsa é, na realidade, o mau uso da política por pessoas mal intencionadas em busca de um objetivo não tão nobre. Devemos, assim, separar a política dos maus políticos; aquela é boa e fundamental para a vida em sociedade e para a harmonia entre os povos. Agradeça à política por não ter de guerrear.
Devemos, dessa forma, louvar a política e agradecer por todos os males terrenos de que ela nos privou. Devemos, contudo, separar a má da boa política, e a melhor forma de fazermos tal separação, em uma democracia representativa como a nossa, é eleger, conscientemente, aqueles que melhor podem nos representar, afinal a política é praticada por todos nós, a todo momento, saibamos e queiramos ou não.
Assim, ainda que seja necessário um certo esforço no Brasil, é possível observar a beleza da política, da arte do diálogo, do debate de ideias e da convergência de propostas para o bem comum e a convivência em sociedade, afinal, não fosse a política, talvez não tivéssemos chegado até aqui.
(Colaboração de José Mário Neves David, advogado e administrador de empresas. Contato: [email protected]).
Publicado na edição nº 10506, de 1º a 4 de agosto de 2020.