A espiral da morte

José Renato Nalini

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Estou lendo o livro que tem esse título: “A espiral da morte”, de Claudio Angelo, Companhia das Letras. A epígrafe é autoexplicativa: como a humanidade alterou a máquina do clima.
Que pena que os céticos das mudanças climáticas não tenham o hábito da leitura. Encontrariam explicações para o fato de o Ártico e a Antártida estarem derretendo. Seria um processo natural do planeta ou temos algo a ver com isso?
Ainda nos escondemos naquela argumentação furada de que o aquecimento da atmosfera gerará consequências daqui a cem anos e eu já não estarei por aqui, então por que me preocupar? Será que não tenho prestado atenção àquilo que tem acontecido em todo o planeta, cansado de emitir sinais em direção aos insanos, insensatos e ignorantes inquilinos que o destroem?
Cláudio Angelo não é um diletante. Foi a fundo. Esteve nos polos. Entrevistou, investigou, estudou. Concluiu que as regiões polares mudam muito mais rapidamente do que todo o restante do planeta. Por isso, improvável que os efeitos dessa mudança não se façam sentir aqui. Na verdade, já estão sendo sentidos. Para ele, “é fundamental entender a velocidade desses processos, saber como eles poderão impactar o Brasil e que atitudes deveremos tomar nas próximas décadas para nos adaptarmos a uma nova e nada simpática realidade de clima”.
Ao escrever seu livro, ainda acreditava que “o negacionismo das mudanças climáticas, que durante anos foi eficaz em plantar a dúvida na cabeça do público, especialmente nos Estados Unidos, perdeu força política”. Será? A permanência do ceticismo é contra todas as evidências. “Por mais que o prazo e a magnitude dos impactos ainda sejam discutíveis, a origem do problema, suas potenciais consequências e a maneira de mitiga-lo estão, para efeito prático, além de qualquer dúvida razoável. A própria marcha da ciência e o próprio método científico trataram de silenciar os autoproclamados “céticos”, depurando pesquisas mal-ajambradas, inconclusivas ou abertamente distorcidas”.
É preciso combinar com os russos, porque o desenvolvimentismo equivocado continua a acreditar que isso constitua uma conspiração de quem não quer ver o Brasil se tornar o celeiro do mundo. Enquanto isso, avança na sua trajetória cíclica e gradualmente ameaçadora, a inevitável espiral da morte.

(Colaboração de José Renato Nalini, Reitor da Uniregistral, autor de “Ética Ambiental”, docente da Uninove e Presidente da Academia Paulista de Letras 2019-2020.)

 

Publicado na edição nº 10451, de 11 a 13 de dezembro de 2019.