A importância do planejamento sucessório

José Mário Neves David

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Um dos eventos mais tristes para uma família é o momento da despedida de um ente querido. Em tal situação, afloram os sentimentos de perda, saudade e luto, e a tendência natural é que os parentes se unam e se consolem neste período de dor e empatia. Há, contudo, situações em que o luto inicial dá lugar ao desentendimento, especialmente quando é chegada a hora do levantamento e divisão dos bens e direitos deixados pelo falecido aos seus herdeiros. Para evitar essa situação desagradável, que muitas das vezes “racha” a família em um momento em que seus componentes mais deveriam se unir, algumas pessoas têm recorrido ao planejamento sucessório ainda em vida, a fim de que, dentre outras razões, seja mantida a harmonia no seio familiar.
Em breves linhas, o planejamento sucessório consiste em medida de organização patrimonial de caráter preventivo, permitindo ao titular do patrimônio que será deixado aos seus herdeiros definir, ainda em vida, o modo como deverá ser efetivada a transferência de seus bens e direitos, tais como imóveis urbanos e rurais, automóveis, participações societárias, investimentos, dentre outros. O planejamento em si abrange questões atinentes a distintas áreas do direito, destacando-se o direito de família, o societário (quando há empresas envolvidas) e, talvez o mais relevante, o tributário.
Ao realizar o planejamento prévio, a pessoa age não apenas no sentido de dirimir as chances de conflito após sua morte, como também confere eficiência e segurança ao processo de inventário, assegura que eventuais desentendimentos não impeçam o correto e normal andamento das rotinas de empresas das quais é controlador, bem como proporciona economia tributária e redução de custos com emolumentos e valores devidos para regularização das matrículas e demais documentos relacionados aos bens e direitos deixados aos herdeiros.
Estima-se que um bom planejamento sucessório, realizado com substancial antecedência ao evento morte e conduzido por um bom time de advogados, reduz em média até 20% do valor despendido com tributos e custas devidos quando da efetivação da sucessão, percentual este que, a depender do patrimônio transferido aos herdeiros, poderá assumir valores vultosos e que, muitas das vezes, não estão à disposição dos familiares – leia-se, dinheiro disponível, no banco – para pagamento dos valores que são cobrados imediatamente após a ocorrência do falecimento. Não raro, os herdeiros veem-se obrigados a vender um bem deixado, o popular “queimar patrimônio”, que pode gerar grande cizânia entre os familiares, para pagamento da quantia devida, sendo o planejamento sucessório um poderoso instrumento para neutralização deste cenário desagradável e inconveniente.
A efetivação do planejamento sucessório tem ganhado novos contornos nos últimos tempos, não apenas pelo aumento do interesse sobre o tema como, também, em razão das recentes discussões acerca da elevação das alíquotas do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações (“ITCMD”), incidente sobre os bens transmitidos aos herdeiros. Este tributo de competência dos Estados e do Distrito Federal atualmente incide à alíquota de 4% sobre as transmissões realizadas no Estado de São Paulo, havendo, contudo, outras unidades da federação que estabelecem alíquotas de até 8%, o percentual máximo aplicável no Brasil. Referido limite foi estabelecido em 1992 pelo Senado Federal e, face ao rombo das contas públicas de parcela significativa dos Estados do Brasil, há grande pressão para majoração do teto, isto é, elevação da alíquota máxima em percentual superior aos atuais 8%, sendo este mais um motivo para a implementação de um bom planejamento sucessório o quanto antes for possível.
Engana-se quem pensa que apenas pessoas idosas se valem do planejamento sucessório: a busca por instrumentos que confiram segurança jurídica e tranquilidade financeira aos herdeiros no momento da sucessão tem sido empreendida por jovens senhores e senhoras, no geral pais e mães de crianças preocupados com o futuro dos descendentes e a harmonia entre os filhos, afinal, feliz ou infelizmente, nunca se sabe quando o inesperado pode acontecer.
Nesse contexto, a estruturação de um bom planejamento sucessório, baseado em instrumentos cíveis (testamento, pactos antenupciais, termos de doação, etc), societários (atas e acordos de acionistas ou quotistas, constituição e estruturação de empresas e holdings patrimoniais, dentre outros) e tributários (estruturação de atos e operações visando economia fiscal lícita), proporcionará não apenas tranquilidade àquele que apenas quer o bem e a tranquilidade de seus entes queridos, como também resultará em economia lícita à família e manutenção dos laços entre os herdeiros, que poderão se ater apenas à lembrança carinhosa do ente que se foi.
No próximo artigo, comentarei brevemente os impactos tributários relacionados ao planejamento envolvendo bens imóveis. Até breve!

(Colaboração de José Mário Neves David, advogado em São Paulo-SP. Contato: [email protected]).

Publicado na edição de nº 10419, de 17 a 20 de agosto de 2019.