A profundidade digital

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A Coréia do Sul até meados do século passado era um país sem expressão ou competitividade no âmbito mundial. Refreada devido a uma grande guerra que dividiu o seu território em dois, a Coréia do Sul vivia quase que exclusivamente da economia agrária, pobre e de pouca sustentabilidade.
Nos anos de 1960, entretanto, uma revolução educacional tomou conta do país e o levou a um desenvolvimento extraordinário, elevando o seu PIB ao patamar de países desenvolvidos e tornando os seus produtos tão competitivos no mercado internacional quanto os produtos japoneses ou americanos. A educação coreana se tornou exemplo para muitos países desenvolvidos ou em desenvolvimento, como é o caso dos Estados Unidos, cujo presidente Barak Obama citou o fato de que alunos coreanos passam ao menos um mês a mais na escola quando comparados aos alunos norte-americanos.
No início do século 21 a Coréia do Sul continuou no embalo do desenvolvimento acelerado, agora levada pelas ondas da tecnologia. De acordo com o governo daquele país, até 2015 todas as escolas deverão substituir o material escolar tradicional (cadernos e livros de papel) por dispositivos eletrônicos. A idéia é fazer uma transição tranqüila e planejada, mas efetiva, permitindo aos alunos o acesso a conteúdos dinâmicos e multimídia, com área de perguntas frequentes, cujo objetivo seria ajudá-los a entender melhor as lições.
A despeito da revolução educacional seguida da revolução digital ocorridas naquele país, educadores e pensadores creditam o sucesso alcançado em tão pouco tempo a um fator que às vezes pode passar despercebido, mas que ali se mostrou fundamental: a atuação da família. O simples fato dos pais acompanharem e se interessarem pelo aprendizado dos filhos impediu que todo o processo se desviasse dos objetivos pré-estabelecidos e caísse na vala comum dos projetos fracassados.

Usando a tecnologia
Debates acalorados têm ocorrido nos Estados Unidos e na Europa sobre o futuro dos livros tradicionais, frente ao desenvolvimento dos e-readers. Para quem ainda não ouviu falar, e-reader é um dispositivo eletrônico que permite a leitura de textos digitais multimídia (texto com imagens, vídeos e sons) dando mais dinamismo à leitura e estimulando o leitor a interagir de forma mais acentuada com o conteúdo apresentado.
Dois dos mais famosos e-readers – Kindle e i-Pad – chegam ao Brasil por preços que variam entre 500 a 1.500 reais, embora a indústria nacional já esteja investindo em produções mais baratas, cabíveis ao bolso do consumidor menos abastado.
Enquanto a venda de livros digitais nos Estados Unidos cresceram cerca de 183% entre 2009 e 2010, no Brasil apenas 3% dos brasileiros já tiveram algum tipo de acesso aos livros digitais, aliado ao fato de ainda apresentarem grande resistência a essa tecnologia.
Curiosamente uma pesquisa da GfK, empresa privada especializada em pesquisa de mercado, indica que a região Nordeste do Brasil é mais receptiva à compra de livros digitais (70%) do que a região Sul (61%) e as classes C e D têm mais interesse (58%) nessa tecnologia do que as classes A e B (54%).

Para o futuro
Dizer que o livro e jornal tradicionais feitos em papel estão com os dias contados seria uma imprudência nesse momento. E também desnecessário. Fato é que pelos exemplos coreano, no que tange à educação digital, e americano, no que tange à leitura digital, entende-se que existe uma forte tendência tecnológica, a qual não pode ficar marginalizada e excluída de uma reflexão nacional.
Evidentemente existem prioridades básicas ainda a serem resolvidas, como é o caso dos 5 milhões de crianças brasileiras fora das escolas e os quase 40 milhões de miseráveis que vivem no país em condições de fome quase absoluta. Se não fizemos a nossa lição de casa no passado, acumulando uma herança maldita de descaso e corrupção, hoje temos que trabalhar rápido e firme nas soluções de nossos problemas. Afinal, a despeito de todo o potencial natural que o Brasil apresenta, não é justo manter uma sociedade alienada, pouco educada e sem poder nenhum de competitividade. Que venham as revoluções!

(Colaboração de Wagner Zaparoli, natural de Bebedouro, doutor em Ciências pela USP, mestre em Ciência da Computação, professor de lógica e consultor. E-mail: [email protected]).

 

Publicado na edição n° 9489, dos dias 20 e 21 de dezembro de 2012.