Marcelo Bosch Benetti dos Santos
A família tem um papel extremamente importante como rede de apoio na recuperação psicossocial do indivíduo.
O transtorno afetivo bipolar consiste em uma perturbação patológica do humor, que ocorre em associação com alterações nos níveis da atividade física e mental do indivíduo. As oscilações de humor caracterizam episódios de hipomania, mania ou depressão. Nos episódios hipomaníacos e maníacos ocorre uma elevação do humor, aumento de energia e da atividade global; nos episódios depressivos, ao contrário, há um rebaixamento do humor, diminuição de energia e redução dos níveis de atividade.
Para a realização do diagnóstico são necessárias perturbações recorrentes de humor (ou seja, no mínimo dois episódios, intercalados por um período de “normalidade” do humor), em que estados hipomaníacos ou maníacos se repitam ou, então, oscilem com episódios depressivos.
A diferença entre hipomania e mania está na intensidade e persistência dos sintomas, bem como na extensão dos prejuízos ocasionados no trabalho e na vida social. Desse modo, a hipomania consiste em um grau mais leve de mania, além de não ser acompanhada por sintomas psicóticos, como pode acontecer nos episódios maníacos.
Nestes episódios mencionados, além da expansão do humor (euforia) e do aumento de energia e atividade, ocorrem: sensações de prazer e de bem-estar; autoestima muito elevada e sensação de grandiosidade; aumento da sociabilidade e da familiaridade; irritabilidade, comportamento presunçoso e grosseiro. Também são comuns: agitação psicomotora; fluxo acelerado do pensamento e da fala; distração; aumento da libido (energia sexual); diminuição da necessidade de sono; e impulsividade, com envolvimento em situações potencialmente perigosas, como negócios arriscados e compras compulsivas/irresponsáveis.
No polo oposto está a depressão, com episódios que podem ocorrer em três níveis de intensidade: leve, moderado e grave, este último com ou sem sintomas psicóticos. Em linhas gerais, acompanhando o humor rebaixado, a desmotivação marcante e a diminuição de energia, os sintomas típicos são: rebaixamento da autoestima e da autoconfiança; sentimento de culpa e de incapacidade; diminuição da concentração; agitação ou retardo psicomotor; pessimismo quanto ao futuro; pensamentos de morte, comportamentos autolesivos ou tentativas de suicídio; sono e apetite alterados (em excesso ou reduzidos).
Ainda, podem haver episódios mistos no transtorno afetivo bipolar, em que sintomas maníacos, hipomaníacos e depressivos se sobrepõe ou alternam rapidamente entre si.
A causa do distúrbio é complexa e incerta, na qual vários fatores como os genéticos, ambientais e psicológicos podem colaborar. Dentre as pessoas afetadas pelo transtorno bipolar, que usualmente surge na adolescência ou no início da vida adulta, muitas podem apresentar outros problemas, como abuso e dependência de álcool e outras drogas, chances aumentadas de suicídio, transtornos ansiosos, transtornos alimentares e frequentemente transtornos de personalidade.
Diante deste cenário, além da psicoterapia e do tratamento farmacológico (acompanhamento psiquiátrico), ambos geralmente de longo prazo, é imprescindível que o paciente desenvolva várias atividades ocupacionais e que lhe despertem interesse e prazer. Atividades manuais ou artísticas, como pintura, artesanato e trabalho com argila estimulam a pessoa a estar no aqui e no agora, favorecendo a concentração e o contato consigo e com o ambiente; compromissos e tarefas cotidianas que favoreçam o autocuidado e a participação no gerenciamento da vida familiar, além de atividades físicas e momentos de lazer.
Os estados maníacos/hipomaníacos, que são os aspectos distintivos do transtorno, nos remete a uma ideia de triunfo da pessoa sobre as intempéries da vida, ou, ainda, sobre as próprias imperfeições, que, entretanto, ela aprendeu a reconhecer com o abandono parcial de sua onipotência infantil. Esta sensação (ilusória) de tudo poder ou de tudo ser, por mais sedutora que seja, é nociva.
Nesse sentido, a família tem um papel extremamente importante, uma vez que ela pode colaborar como rede de apoio na recuperação psicossocial do indivíduo. Principalmente nos casos graves do transtorno é comum a pessoa apresentar dificuldades em organizar e planejar diferentes áreas de sua vida, assim como muitas desenvolvem resistências à continuidade dos tratamentos quando alcançam um estado de maior equilíbrio, negando a gravidade do problema. A família poderá estimular a adesão do paciente aos acompanhamentos, bem como auxiliá-lo em seu processo de autonomia e independência.
(Colaboração de Marcelo Bosch Benetti dos Santos, Psicólogo, especialista em Psicologia Clínica, mestrando em Psicologia Clínica – PUC-SP).