Acordo Mercosul-União Europeia é um gol de letra

José Mário Neves David

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O histórico acordo firmado entre a União Europeia (UE) e o Mercosul, anunciado em 6 de dezembro, marca o fim de 25 anos de negociações entre os dois blocos econômicos. O acordo visa fortalecer as relações comerciais, políticas e de sustentabilidade entre as regiões, representando um marco significativo para a diplomacia e para o comércio dos países envolvidos, ainda que alguma resistência de determinados países e setores da economia ainda seja observada.

O acordo prevê uma redução gradual das tarifas de importação para produtos agropecuários e industriais, bem como a liberalização do comércio de serviços entre os signatários. Entre os destaques, estão a eliminação total de tarifas para frutas como abacates, limões, melões e uvas, e o estabelecimento de cotas para carnes bovina, de aves e suína. No setor automotivo, a redução tarifária para veículos eletrificados ocorrerá ao longo dos próximos 18 anos, ao passo que, para veículos a hidrogênio e novas tecnologias, os prazos são de 25 e 30 anos, respectivamente.

Um dos aspectos mais relevantes do acordo é o compromisso com a sustentabilidade e o combate às mudanças climáticas. O texto reforça o comprometimento ambiental e econômico entre os países signatários, rejeitando “barreiras comerciais desnecessárias” e estabelecendo uma série de compromissos para a proteção ambiental e a promoção do trabalho digno. Além disso, o acordo pode ser suspenso se uma das partes violar gravemente o Acordo de Paris ou decidir abandoná-lo, o que, em certa medida, deixa uma porta de saída para ambas as partes.

Para facilitar a transição justa para uma economia verde e digital nos países do Mercosul, a UE estabeleceu um fundo de €1,8 bilhão. Tal fundo será utilizado para desenvolver cadeias de valor sustentáveis em florestas, como na região amazônica, e adaptar pequenas e médias empresas, bem como povos indígenas e comunidades tradicionais, aos padrões do acordo.

O impacto econômico do acordo é significativo. O governo brasileiro estima que o comércio entre o Brasil e a UE aumentará em R$ 94,2 bilhões, representando crescimento de 5,1% no comércio atual. Além disso, projeta-se aumento de R$ 37 bilhões no PIB brasileiro, equivalente a aproximadamente 0,34% da economia do país. Embora os efeitos não sejam imediatos, espera-se que até 2044 haja aumento de R$ 13 bilhões em investimentos no Brasil, redução de 0,56% nos preços ao consumidor e aumento de 0,42% nos salários reais.

Este acordo representa uma oportunidade única para ambos os blocos fortalecerem suas posições geopolíticas e econômicas e sua aprovação, após longos anos de negociação, foi fomentada pela eleição do protecionista Donald Trump nos Estados Unidos da América. Nesse sentido, o acordo não apenas deve promover o crescimento econômico e a competitividade dos países e respectivas empresas e produtores, mas também deve estabelecer padrões mais elevados para o desenvolvimento sustentável e a proteção ambiental. Com a conclusão das negociações, o próximo passo é a revisão jurídica e a tradução do acordo, com vistas à futura assinatura e implementação.

Assim, o histórico acordo firmado, fruto de negociações intensas e da atuação política e diplomática dos países envolvidos, representa uma oportunidade de crescimento para a economia do Brasil, já que produtos e serviços poderão ser mais facilmente destinados ao bloco europeu, assim como fomenta o desenvolvimento da indústria e do setor produtivo nacional, uma vez que novos concorrentes entrarão no mercado brasileiro e, com isso, maior competitividade de mercado deverá ser observada. Ganha o consumidor, ganha o país. Torcemos para que os entraves burocráticos e políticos para a plena implementação do acordo e que ainda estão presentes sejam rapidamente contornados.

(Colaboração de José Mário Neves David, advogado, conselheiro e consultor. Contato: [email protected]).

Publicado na edição 10.894, de 21 de novembro de 2024 a 10 de janeiro de 2025 – Ano 100