
Marcelo Bosch Benetti dos Santos
O psiquiatra americano Richard Gardner, na década de 80 do século passado, detectou que em processos de divórcio litigioso era comum o genitor detentor da guarda do filho desqualificar e denegrir propositadamente a imagem do outro genitor, com a finalidade de afastá-lo da criança. A esse processo de afastamento entre um dos pais e o filho dá-se o nome de alienação parental.
O familiar que opera este distanciamento é denominado “alienador”, e geralmente se refere ao genitor que detém a guarda unilateral da criança. Entretanto, a alienação parental pode ocorrer ainda enquanto os pais estão casados, e nem sempre um dos genitores é o único ou o exclusivo “agente alienador” nesse processo, uma vez que tios, avós e até mesmo babás podem exercer esse papel.
Além disso, fora da família, amigos ou conhecidos do alienador, a escola, profissionais de ajuda (médicos, psicólogos, assistentes sociais) e advogados podem favorecer o processo de alienação parental e atuarem eles mesmos como alienadores.
Em relação aos profissionais de ajuda ou da área do Direito e da Educação, isso ocorre à medida que se deixam seduzir ou enganar pelo discurso distorcido do alienador, restringindo suas análises e avaliações a ele e ao discurso da criança. Nesse sentido, é importante ouvir todas as partes envolvidas no processo, e até mesmo outros profissionais que já acompanharam ou estejam acompanhando o caso, a fim de ampliar os dados e manter a neutralidade necessária para o melhor desfecho da situação.
Quanto aos amigos ou conhecidos do alienador, estes também podem ser alvos de manipulações e tentativas de convencimento a respeito de um suposto risco ou nocividade que a proximidade do outro genitor traria para o filho em comum, o que justificaria o seu afastamento.
No caso da escola, muitas vezes o alienador solicita que não entre em contato com o outro genitor, de maneira a não dar informações a respeito do processo de escolarização do filho. Ele justifica esta proibição por o genitor alienado não ser o guardião do filho ou o responsável por arcar com os gastos da criança, inclusive com os da escola.
Entretanto, a escola possui amparo e obrigação legal para compartilhar as informações pedagógicas e comportamentais dos alunos menores de idade a ambos os genitores, independentemente de estarem unidos ou de quem possui a guarda ou convive com a criança.
Nesse sentido, a orientação é que a escola deixe claro este seu posicionamento para os pais no ato da matrícula e na assinatura do contrato. A participação da vida escolar do filho tanto pelo pai quanto pela mãe (ou por seus principais cuidadores) é muito importante, inclusive nas situações em que ocorrem um processo de alienação parental. Além disso, não podemos esquecer, neste caso, que o próprio genitor alienado pode terminar por reforçar a alienação parental, caso demore a perceber o fenômeno e a intervir adequadamente sobre ele.
E com todos os desdobramentos que a alienação parental pode ocasionar, são as crianças e os adolescentes vítimas desse processo que mais sofrem, uma vez que geralmente desenvolvem um conflito interno no qual questionam se de fato são amados e desejados por seus pais. Além disso, podem apresentar comportamentos específicos, como: distorções de percepção em relação ao pai alienado ou à mãe alienada; sentimento de raiva e ódio contra o genitor alienado; resistência em entrar em contato com ele; apresentar baixa autoestima e baixa autoconfiança; transtornos de ansiedade e transtornos depressivos; dificuldades em estabelecer uma relação estável e segura com as pessoas, devido a sensações de insegurança, inadequação, culpa e timidez; e problemas na identificação de gênero (masculino ou feminino), em vista da desqualificação sistemática do genitor atacado.
Assim, o objetivo maior no processo de divórcio ou separação dos pais, mesmo que de maneira litigiosa, é a guarda compartilhada da criança, desde que, obviamente, não haja situações extremas e de risco para ela diante da convivência com um de seus genitores (como negligência de cuidados e suspeitas de violência física, psicológica ou sexual).
Na guarda compartilhada – prevista em lei, mas que muitas vezes é exercida mesmo quando a guarda é unilateral -, ambos os genitores serão os responsáveis pelo menor, e dividirão os direitos e os deveres com seus cuidados, assim como as informações importantes relacionadas à vida do filho.
Por fim, vale ressaltar que o alienador tem como um de seus principais motivos para seus atos a mágoa e a raiva que mantém do outro genitor, confundindo, com isso, conjugalidade com parentalidade. Não estarem mais juntos enquanto cônjuges não exclui a paternidade e a maternidade que cabe a cada um; e, portanto, a responsabilidade ética de educarem e cuidarem psíquica e emocionalmente de seus filhos.
(Colaboração de Marcelo Bosch Benetti dos Santos, Psicólogo, especialista em Psicologia Clínica, mestrando em Psicologia Clínica – PUC-SP).
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Leia mais na edição nº 9900, dos dias de 8 e 9 de outubro de 2015.