Alterações no Imposto sobre a Renda

José Mário Neves David

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O governo federal recentemente apresentou um Projeto de Lei (PL) que altera a legislação do Imposto sobre a Renda (IR) no Brasil, especialmente a tributação incidente sobre as pessoas físicas. A proposta visa reduzir a cobrança do IR sobre as rendas mais baixas, com compensações de arrecadação sobre os que mais ganham no Brasil. Porém, a lógica não é tão cartesiana.

De acordo com o texto do projeto, haveria ampliação da faixa de isenção. Hoje, pessoas que ganham até R$ 2.259,20 ao mês estão isentas do IR, e o PL propõe a elevação dessa faixa de isenção para ganhos mensais de até R$ 5.000,00, uma renúncia fiscal estimada em aproximadamente R$ 27 bilhões ao ano. Esse valor, que deixaria de ser arrecadado aos cofres públicos, seria compensado pela elevação da tributação dos mais ricos, através da implementação do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas Mínimo (IRPFM).

O IRPFM seria cobrado dos contribuintes que auferirem renda superior a R$ 600 mil anuais, a alíquotas adicionais de até 10%. A tributação pelo IRPFM se daria da seguinte forma: alíquota adicional de 2,5% de IR para quem ganha até R$ 900 mil/ano; de 5%, para quem ganha até R$ 1,05 milhão/ano; 7,5%, para as pessoas físicas que auferem renda de até R$ 1,2 milhão/ano; e alíquota adicional de 10% para quem ganha a partir de R$ 1,2 milhão por ano.

Outra alteração importante diz respeito à tributação sobre os lucros e dividendos distribuídos aos sócios de empresas, inclusive os residentes fiscais no exterior. Nas distribuições, essas pessoas estariam sujeitas ao pagamento de IR na fonte à alíquota de 10%. Hoje, as distribuições em questão são isentas de IR, mas passariam a ser tributadas, o que, indiretamente, favoreceria o reinvestimento dos lucros no próprio negócio.

Apesar das boas intenções do PL, alguns pontos devem ser colocados na mesa para análise mais profunda. Inicialmente, não está claro se o valor arrecadado de forma adicional sobre ganhos superiores a R$ 600 mil ao ano e sobre a distribuição de lucros e dividendos compensa, de fato, a renúncia fiscal sobre os que ganham até R$ 5 mil ao mês. Os dados e estudos apresentados pelo governo federal são obscuros e, de certa forma, imprecisos ou demasiadamente otimistas.

Adicionalmente, há clara motivação política e populista na medida, pois reduz a carga tributária das classes sociais mais baixas a pouco mais de um ano das eleições presidenciais – e o atual mandatário quer muito a reeleição. Apesar do benefício social e da justiça tributária, o timing do PL é questionável e a situação fiscal do país não permite aventuras em termos de controle de gastos e renúncia de receitas.

Ademais, há dois pontos para reflexão: i) será que, no contexto atual de custo de vida em elevação, as pessoas que ganham R$ 600 mil ao ano podem ser consideradas, de fato, ricas e passíveis de tributação adicional? e ii) a tributação da distribuição de dividendos deveria, como amplamente discutido no passado, ser acompanhada de redução da carga tributária das pessoas jurídicas, a fim de evitar distorções econômicas e prejuízos à competitividade das empresas brasileiras. Esse “detalhe” foi convenientemente ignorado no PL.

É importante ressaltar que o PL ainda está em fase de debate no Congresso Nacional, e sua evolução legislativa na Câmara dos Deputados e no Senado Federal nos próximos meses deve ser acompanhada com lupa. Essa atenção ao tema possibilita que seus impactos e eventuais ajustes futuros sejam plenamente compreendidos, para que as pessoas físicas e jurídicas possam se preparar adequadamente para as alterações que venham a ser efetivamente implementadas.

(Colaboração de José Mário Neves David, advogado, conselheiro e consultor. Contato: [email protected]).

Publicado na edição 10.913, quarta, quinta e sexta-feira, 2, 3 e 4 de abril de 2025 – Ano 100