O ceticismo fez com que iniciativas de adoção de uma responsabilidade social das empresas derivassem em greenwashing. O uso falacioso de uma rotulagem ética, para a continuidade de práticas antiecológicas. Só que desta vez há uma diferença. Os eventos extremos são cada vez mais frequentes. Chegam a cada momento mais próximo de nós. É impossível deixar de observar o que tem acontecido no mundo todo e em nossa casa.
A legítima defesa da Terra passa por uma profunda conversão dos humanos. É mais do que urgente deixar o egocentrismo tolo, a desmedida ambição, a insanidade que já destruiu a maior parte de nossos biomas, para tentar reverter a tragédia que se avizinha a céleres passos.
É importante que a sigla ESG seja levada a sério em todos os espaços e por todas as pessoas. Importante, sim, venha a ser objeto de currículos escolares em todos os níveis. Mas é mais necessário ainda, seja introjetada na consciência cidadã e disseminada para absorção por toda a comunidade que se considera racional.
Soluções sustentáveis começam dentro de casa. Depende de cada um de nós gastarmos menos água, menos energia, produzir menos resíduo sólido. Plantar uma árvore está ao alcance de qualquer humano. Interessar-se pela logística reversa, inteirar-se do que já existe e do que ainda falta em economia circular, é algo que inverte a equação maldita que tem prevalecido até o momento. Utilizar-se da natureza como se fora um supermercado gratuito, do qual tudo se leva, nada se repõe.
A ideia de sustentabilidade é tão simples quanto sedutora: saber usar, não vai faltar. Qual a nossa contribuição pessoal para a disseminação e para a efetiva prática dessa filosofia salvífica?
A cidadania que se pretende participativa, que critica a política partidária – raiz de todos os males – tem a obrigação de exigir dos governos, em todos os níveis, que cumpram a Constituição da República em seu artigo 225, dispositivo que foi considerado a mais bela norma constitucional produzida no século 20. Mas o zelo e a preservação da natureza são para valer, não para enfeitar compêndios doutrinários e decisões judiciais.
Assuma-se ESG ou aguarde o caos. Ele não tem poupado no envio de recados de que está cada vez mais perto de nós.
Duelo de titãs
Quando se lamenta a indigência do debate público, mais afeiçoado a questiúnculas e a mesquinharias do que à defesa dos interesses nacionais, tende-se a generalizar o ambiente político. Para muitos, seria composto de nulidades que empolgam iletrados e, ao preço de favores prestados por conta do Estado, obtêm sinecuras perpétuas. É um exagero pensar que todos os políticos são nulidades ou movidos por ambição que corrompe.
Nem sempre foi assim, nem deverá tal ideia “clichê” prevalecer como técnica de coordenação da busca do bem comum. Já tivemos personalidades maiúsculas, gigantes morais, gente de outra têmpera. É conveniente retirá-la do ostracismo e ressuscitar suas trajetórias, como inspiração para a juventude sequiosa de ética na política.
Pense-se no que representou para o Brasil a figura de José Bonifácio de Andrada e Silva e o confronto dele com o Padre Diogo Antonio Feijó. Ambos paulistas. O primeiro santista, o segundo paulistano. Donos de personalidade muito forte. Ambos notáveis pelos serviços prestados à Pátria. Mas adversários.
Feijó, enquanto Ministro da Justiça, envolveu-se em pugna colossal com Bonifácio. Queria a demissão do Patriarca das funções de tutor do Imperador Pedro II. Foi um dos grandes acontecimentos parlamentares entre 1831 e 1832. Acusando os Andradas, tanto José Bonifácio como seu irmão Antônio Carlos, da provocação de graves tumultos na capital, Feijó foi bem duro, como era o seu estilo: “Ou José Bonifácio deixa a tutoria, ou eu deixo a pasta da Justiça”.
Na Câmara, Feijó venceu. No Senado, foi batido por um voto. José Bonifácio continuou como tutor e Diogo Feijó demitiu-se do cargo de ministro. Só que essa demissão deu origem ao chamado golpe de Estado de 30 de julho de 1832. Tal era seu prestígio, tal sua força moral, que todo o ministério também renunciou e, logo em seguida, a Regência Trina.
Diogo Feijó demitiu-se do ministério, mas foi eleito senador e tornou-se, em seguida, Regente do Império. José Bonifácio foi removido da tutoria do menino imperador e substituído pelo Marquês de Itanhaém. Algo comum entre ambos: esquecidos, injustiçados, morreram sozinhos e abandonados. Os políticos do século XXI deveriam ter presente essa realidade: a fama e a bajulação servem aos cargos, não às pessoas. Não se iludam com o afago hoje oferecido pela mão que amanhã o apedrejará.
(Colaboração de José Renato Nalini, Diretor-Geral da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras).
Publicado na edição 10.745 de quarta, quinta e sexta-feira, 29, 30 e 31 de março de 2023