Há alguns dias, assisti a um vídeo que anda circulando nas redes sociais e dando muito o que falar. Trata-se de uma empresária contando que fez uma venda de R$ 450,00 a uma cliente, porém, esta não pagou. Fazia contatos em busca de seu crédito, até que a mencionada pessoa bloqueou seus telefonemas para evitar a cobrança. A credora foi cobrar a cliente em seu trabalho, esta, entretanto, lavrou um boletim de ocorrência policial por cobrança abusiva e crime contra o consumidor. Resultado: a empresária ficou sem receber seu crédito e foi obrigada a prestar serviços comunitários em uma escola por um mês.
A narrativa chocou muitas pessoas que entenderam injusta a punição, afinal de contas, a errada era a cliente inadimplente e não a empresária que levou o calote.
É claro que a cliente inadimplente estava errada, mas como dizia meu avô, um erro jamais pode justificar outro erro. É que a lei entende que, apesar da dívida existir, ninguém pode ser cobrado de forma abusiva, ser exposto ao ridículo, constrangimento ou ameaça.
O art. 71 do Código de Defesa do Consumidor considera crime a cobrança abusiva, quanto mais se houver qualquer interferência no trabalho, descanso ou lazer do consumidor. E a pena é de detenção de seis meses a um ano ou multa (no caso do vídeo, deve ter havido substituição por uma pena alternativa).
Inclusive, nossos Tribunais vêm entendendo que, além do crime, o cliente pode também ser indenizado por eventuais danos morais sofridos.
E qual seria o correto comportamento do empresário para cobrar a sua dívida?
A forma legal de cobrança deve ser planejada antes mesmo da venda ou concessão de crédito. Ao realizar a venda, o ideal é formalizar tudo em contrato, ainda que básico, constando pelo menos as partes, o produto, data e forma de pagamento. O vendedor deve ter, ao menos, um comprovante da entrega da mercadoria ou realização de seu serviço. E, claro, emitir a nota fiscal.
Com esses cuidados mínimos, a empresária poderia tentar um contato amigável (sempre em horário comercial, fora do trabalho e jamais em finais de semana e feriados.) e, se infrutífero, tomar medidas coercitivas administrativas, como a negativação do nome do devedor através de protesto ou inscrição em órgãos de proteção ao crédito, ou mesmo ajuizar um processo judicial visando a penhora de valores ou bens. Desta forma, devidamente documentada, estaria exercendo o seu direito de cobrança, nos termos aceitos pela lei e sem qualquer abuso.
Válido sempre lembrar que, em casos de dúvida, o melhor é não correr riscos e consultar o advogado de sua confiança.
(Colaboração de Daniel Guedes Pinto, advogado e professor universitário.)
Publicado na edição nº 10432, de 2 a 4 de outubro de 2019.