Direitos – e deveres – da pessoa transgênero

Daniel Guedes Pinto

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Muito se fala dos direitos da pessoa transgênero, como o direito a adotar nome social, ser tratado conforme sua identificação interior, usar o banheiro que se sentir melhor, não sofrer discriminação, dentre outros. Nosso Supremo Tribunal Federal, neste ano, determinou até que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero passe a ser considerado crime, mesmo não havendo lei específica sobre o tema.
Transgênero é a pessoa que não se identifica com o gênero que nasceu, mas sim com o do sexo oposto. Um homem no corpo de mulher ou a mulher em um corpo de homem. Isso não depende de realização de cirurgia para redesignação de sexo ou mesmo com a homossexualidade, pois a pessoa pode ser homossexual sem que seja transgênero. Basta que a pessoa manifeste a sua vontade, podendo até mesmo alterar seu registro civil para que passe a constar oficialmente sua nova identificação. Assim já entendeu a corte suprema do Tribunal Federal.
Apesar dos muitos direitos reconhecidos por essas minorias, pouco se fala quanto as consequências jurídicas referentes aos deveres da pessoa transgênero.
A partir do momento que a pessoa realiza a retificação do gênero perante a sociedade, esta passa a ser vista e tratada como deseja. Se nasceu homem, mas se entende como mulher, será socialmente considerado uma pessoa do sexo feminino e o mesmo no caso da mulher que se entende como homem.
Mas, aí vêm as questões jurídicas. Como tratar o transgênero, por exemplo, perante os direitos previdenciários, já que a aposentadoria por idade é concedida ao trabalhador que atinge 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher? Qual a idade e tempo de contribuição será aplicada na aposentadoria para transgêneros?
Há uma série de razões que levou nossa lei a tratar homens e mulheres de forma diferente quanto a aposentadoria, como maternidade, menstruação, menopausa, fragilidade muscular e até o preconceito profissional no mercado de trabalho.
Não existe uma regra específica quanto aos transgêneros, muito pelo contrário, há muita divergência. O entendimento que se vem tendo como mais justo é que mulher transgênera (nascida inicialmente como homem) obedecerá às regras aplicáveis às mulheres, considerando-se a época em que houve sua transformação. Assim, por um critério matemático se o transgênero retificasse sua identidade no meio de sua vida profissional, por exemplo, aos 40 anos, seria preciso aplicar uma proporcionalidade entre 60 e 65 anos para se aposentar.
Em um caso concreto, a Justiça cancelou a pensão do filho transexual de um militar da Marinha após ele assumir sua identidade de gênero masculino (na legislação militar as mulheres solteiras têm garantido um benefício vitalício quando do falecimento dos pais). Na decisão o Judiciário entendeu que o cancelamento da pensão foi em respeito à sua “condição existencial”, tratando-o como dever ser tratado, em todos os sentidos.

(Colaboração de Daniel Guedes Pinto, advogado e professor universitário).

Publicado na edição nº 10437, de 19 a 22 de outubro de 2019.