Com mais de 50 países atravessando processos eleitorais, o mau uso da inteligência artificial em campanhas políticas se tornou uma das grandes preocupações de 2024.
No Brasil, enquanto o Congresso não chega a um consenso quanto ao Projeto de Lei 2.630/2020 (Lei das Fake News), que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) assumiu a dianteira e aprovou um conjunto de normas para regulamentar a tecnologia durante o pleito municipal.
A maior preocupação é a utilização da Inteligência Artificial com a finalidade de divulgar notícias falsas que se valem de deepfakes com imagens de pessoas reais com a sobreposição de conteúdo manipulado.
Nesse sentido, a Resolução nº 23.732/2024 do TSE trouxe alguns mecanismos para minimizar os impactos negativos da IA na propaganda eleitoral. Entre as principais regras impostas a partidos e candidatos estão: a obrigação de rotular destacadamente conteúdo multimídia fabricado ou manipulado por IA; a proibição explícita de deepfakes; a restrição ao uso de chats e avatares para intermediar a comunicação entre candidatos e eleitores.
Por outro lado, a tecnologia poderá ser utilizada, de forma ética e responsável, para: melhorar a qualidade de imagem ou de som; a produção de elementos gráficos de identidade visual; a confecção de material impresso e digital de propaganda.
Para penalizar aqueles que descumprirem as normas, o texto prevê multas e cassação do registro de candidatura e do mandato. Sem prejuízo das disposições do Marco Civil da Internet, quanto à responsabilidade dos provedores de aplicação de internet no âmbito cível, a Resolução do TSE prevê disposições rígidas para as plataformas que não derrubarem imediatamente conteúdos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados durante o período eleitoral.
Apesar de criticada, a regulação do TSE tem a intenção de nos deixar menos expostos ao potencial de disseminação de informações falsas, indução ao erro e manipulação dessas ferramentas, especialmente em razão da falta de regulamentação no país.
O Brasil tem grande potencial para aprimorar esse debate, com sua experiência, a ser acompanhado como um laboratório pelo resto do mundo, podendo ser uma ótima oportunidade de exportarmos boas práticas.
É claro que ainda temos muitos desafios pela frente. Entre eles, a capacitação técnica do Judiciário, a dificuldade de fiscalização, a ausência de jurisprudência e a sobrecarga da Justiça. O debate precisa avançar, considerando as complexidades do mundo digital e as necessidades das corporações e dos cidadãos que dependem de uma internet aberta, segura e protegida.
As mídias sociais, inicialmente celebradas por suas contribuições democráticas, tornaram-se problemática devido à desinformação, manipulação, vigilância e outros efeitos negativos. Agora, é necessário que todos os agentes envolvidos atuem em cooperação para mitigar esses riscos, por meio de leis que promovam a transparência e a responsabilidade.
O futuro das regulamentações digitais dependerá de um equilíbrio delicado entre segurança, privacidade e liberdade de acesso.
(Colaboração de Rodrigo Toler, advogado de Privacidade e Proteção de Dados no Opice Blum, Bruno Advogados. É Mestre em Direito, Tecnologia e Desenvolvimento pelo IDP. Email: [email protected]).
Publicado na edição 10.876, de sábado a terça-feira, 28 a 30 de setembro e 1º de outubro de 2024 – Ano 100