Ao ler o recente artigo publicado na última edição da Gazeta, intitulado “Aonde você vai, menina?”, escrito por Marco Antônio dos Santos, muitas reflexões me vieram a mente sobre “Para onde caminha a educação de nossas crianças e adolescentes?”. O artigo suscita importantes inquietações a respeito da maneira precoce como nossas crianças e adolescentes vem se comportando na nossa sociedade. Vestem-se semelhante aos adultos, sem limites de horários para sair e com usos irrestritos do computador, é cada vez mais comum presenciarmos crianças em situação de completa “vulnerabilidade” sem a supervisão de um adulto, num caminho que parece sem volta.
Não há como se falar em educação sem amor, cuidado e disciplina. Esse tripé vem sendo defendido por grandes especialistas na área do desenvolvimento moral da criança, mas infelizmente, não tem sido colocado em prática numa sociedade em que a transgressão parece ser a regra e em que os valores se banalizaram.
Por que uma criança ou adolescente obedece uma regra? Porque ela obedece e respeita quem impõe essa regra e essa pessoa é efetivamente investida de poder (pai, mãe, avó, educadores). Respeita-se porque há uma fusão de afeto, amor e medo. Eu não defendo, em hipótese alguma, o uso de punição física, nem de posturas que coloquem a criança ou o adolescente em situações vexatórias ou humilhantes. Mas há sempre maneiras seguras e eficientes de se impor disciplina, como sinal de preocupação, amor e cuidado com o outro.
De acordo com Yves de La Taille, psicólogo e Professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, estudioso de Piaget, Vygotsky e Wallon, viver em sociedade implica em aceitar limites e um dos fatores que dificultam a colocação de limites é a falta de limites dos próprios adultos que também carecem de tais limites. Existe uma crise de valores onde se perdeu a noção do que é certo ou errado e isso gera uma “despotencialização” da família, e muitas vezes da escola. Despotencialização tem a ver com crise de identidade, pois muitos pais delegam para a escola ou para terceiros a tarefa de educar que deveria ser prioritariamente da família. Quando a escola tenta discutir essas questões, há uma incompatibilidade com os ideais da família.
Muitas vezes, com receio de praticar o autoritarismo (influência das décadas de 60 e 70), ou de se perder o amor dos filhos, muitos pais deixam de colocar limites e de dizer um “não” muitas vezes tão importante e necessário e que iria contribuir para o processo de desenvolvimento saudável de seu filho. É imprescindível que as crianças aprendam a lidar com as frustrações. Não dar regras e orientações firmes e claras é a melhor maneira para se criar “pequenos tiranos”.
Autores que estudam o campo da moralidade defendem a ideia de uma educação elucidativa, ou seja, todas as vezes que uma ordem ou repreensão é dada, vem acompanhada da explicação de sua razão de ser, pois explicar o motivo da regra é respeitar a pessoa. Não existe melhor maneira de educar do que praticar constantemente aquilo que se pretende ensinar, demonstrando que deve existir sempre uma coerência entre o discurso e a ação. Em outras palavras, o adulto precisa ser o exemplo que se pretende ver na criança.
É essencial que nossas crianças sejam desafiadas para serem melhores do que são. Muitas famílias contemporâneas aliviam os filhos até de suas responsabilidades consigo mesmos, com as tarefas da escola, com os horários para dormir e acordar, com os cuidados com seus pertences pessoais, filhos são levados de carro a locais que poderiam facilmente chegar a pé. Isso confere à criança um sentimento de incompetência e falta de autonomia que leva para o resto da vida, atée para resolver pequenos problemas do dia a dia. Ao subestimarem o potencial dos filhos, limitam seu potencial de crescimento.
Estabelecer limites saudáveis é algo trabalhoso e exaustivo, mas é o único caminho que impulsiona o indivíduo a crescer.
(Colaboração de Ana Silvia Bergantini Miguel, diretora do Departamento Municipal de Educação de Bebedouro, professora e mestre em educação).