Gente utraprocessada

José Renato Nalini

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Comemos mal. Alimentamo-nos com ultraprocessados, algo que sequer pode ser chamado “comida”. O que compramos para comer pode ser resto da indústria do bioetanol e do milho. Serviria apenas como alimento industrial para animais, não pode ser reaproveitado para consumo humano. Só serve para nos viciar, nos manter reféns dessa indústria nociva, para engordar e para levar nosso dinheiro.

Quem diz isso não sou eu. É o infectologista britânico Chris van Tulleken, que atua no Hospital de Doenças Tropicais em Londres e é professor na University College London – UCL. Ele escreveu o livro “Gente ultraprocessada: por que comemos coisas que não são comida e por que não conseguimos parar de comê-las”, publicado pela Editora Elefante.

O conceito de ultraprocessado é brasileiro e faz parte da classificação NOVA, criada pelo médico Carlos Monteiro e seus colegas do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde – NUPENS, da USP. Para resumir, esse produto se submeteu a processos industriais diversos e contém ingredientes que ninguém usa na cozinha doméstica: aromatizantes, corantes, conservantes, emulsificantes e outros aditivos.

Os ultraprocessados estão na base da pandemia de sobrepeso e obesidade. O médico pretende que os pais, principalmente as mães, sintam nojo dessa pretensa comida, antes de fornecê-la a seus filhos. Para o médico, “é a comida mais nojenta de todas, se você parar para pensar”.

A ideia de ultraprocessado não está apenas nos alimentos. Tudo é ultraprocessado em nossa época: os celulares, a música, tudo a observar os mandamentos dos conglomerados industriais que ganham com isso. com sacrifício da natureza e da aventura humana: essa indústria emite os gases de efeito estufa, destrói a capacidade do planeta de absorver esses gases, pois exterminamos a floresta para cultivar soja, palma e criar gado.

É triste concluir que, nos últimos 150 anos, a comida se tornou “não comida”. Foram as mulheres que conseguiram extrair energia e nutrientes de milhares de plantas e animais diferentes. As empresas conseguiram fazer com que as mulheres não cozinhem mais e pagaram cientistas habilidosos para desenvolver a comida que vicia. Quem não quer continuar a ser cobaia, deve ler esse livro.

(José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Secretário Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo).

Publicado na edição 10.892, sábado a sexta-feira, 7 a 13 de dezembro de 2024 – Ano 100