O pensador alemão Walter Benjamin (1892-1940) escreveu muito. Inclusive artigos publicados em jornais. Textos que foram reunidos no livro “Walter Benjamin – Literatura”, organizado por Maria Aparecida Barbosa e publicado pela Editora Cultura e Barbárie.
Foram escritos em 1920, mas parecem atuais. Num deles, o autor fala do personagem Cagliostro, um vigarista italiano do século 18, que tentou reconciliar os maçons com o Papa. Esperava, como mediador entre duas instâncias poderosas, conquistar influência suprema dentro da Europa.
Era o apogeu do Iluminismo e as pessoas acreditaram na proposta de Cagliostro. Não podia dar certo a aliança Maçonaria-Igreja Católica. A conclusão de Benjamin é a de que os estúpidos não desaparecem. Algo que Umberto Ecco reverberou, ao afirmar que antes da internet, o iletrado falava no balcão do botequim, para ser ouvido por meia dúzia de energúmenos. Hoje ele alcança o mundo e obtém milhares de seguidores.
O que talvez não surpreendesse Benjamin é a realidade atual. Os estúpidos não desapareceram. Eles se multiplicaram. Seu nome hoje é legião. A estupidez proliferou vertiginosamente e se dissemina por toda a face da Terra. Promovendo discórdias e guerras fratricidas. Aumentando o arsenal de armas, inclusive mísseis atômicos. Propondo o cancelamento de quem pensa diferente. Atribuindo ao estrangeiro todas as mazelas. O que explica a vitória do Brexit no Reino Unido, quando cidades que não tinham um só imigrante votaram convencidos de que o forasteiro ia tirar seu emprego e poria em risco a economia britânica?
Esse é apenas um exemplo. Há tantos outros e tão próximos de nós. A vitória da ignorância, da breguice, da fancaria, da mediocridade, do mau gosto. O brasileiro já comprou bondes no Rio, já comprou terreno na lua, acredita que vacina tenha um chip e transforme o vacinado em jacaré, que a terra é Plana, que quem o chama de idiota merece o seu voto. Aqui está certo. Só um idiota é convencido a votar em quem o considera idiota e o trata como idiota.
Alguma chance de reversão dessa tendência a ser enganado com a efetiva colaboração da vítima? Parece impossível. É aquela noção singela de estelionato, crime que é sempre perpetrado com a participação ativa do lesado. Característica da fragilidade da espécie humana, aquela que se vangloria de ser a única racional, primícia entre as demais criaturas.
Fuga de talentos
O Brasil não tem sabido aproveitar devidamente o seu profissional qualificado. Embora a Universidade brasileira se baseie na tríade ensino, pesquisa e extensão, os pesquisadores não têm as condições essenciais à realização de um trabalho fecundo e consistente. Por esse motivo, é normal que os mais promissores procurem Universidades em outros países. E lá chegando, ao constatar o prestígio conferido a quem realmente saiba pesquisar e tenha foco, é logo aproveitado o brasileiro que buscou paragens outras para concretizar seus sonhos.
Os estudantes que vão para o exterior em busca de uma qualificação mais aprimorada, raramente retornam ao Brasil. Esse fenômeno já era verificado em relação a países como o Canadá. Um Cônsul Geral do Canadá em São Paulo comentou comigo, há alguns anos, que os brasileiros que iam estudar lá não mais queriam voltar.
Outra circunstância nova deveria preocupar os responsáveis pela pesquisa brasileira. Há algumas décadas, procurava-se o exterior para a pós-graduação. Hoje, o país estrangeiro é destino da própria graduação. É o que tem acontecido diante da incapacidade da educação brasileira oferecer oportunidades para formação profissional com demanda para o sofisticado mercado das tecnologias contemporâneas.
Tais questões deveriam motivar as autoridades brasileiras a repensarem as reais necessidades do país. Por exemplo: é urgente reflorestar as áreas degradadas, que serviram para plantio de culturas que exaurem a terra, como a cana-de-açúcar, por exemplo. Em seguida, se transformam em pastos para a pecuária. Depois, são condenadas a se converter em deserto.
Existem muitas áreas deterioradas que precisam ter a sua cobertura vegetal recomposta. Mas não temos técnicos capazes de realizar a tarefa. Muitas outras funções estão desguarnecidas, sem que o Brasil cuide de oferecer alternativa à mesmice na formação de bacharéis em direito, que depois permanecerão a exercer a mesma atividade anterior ao bacharelado. Porque o mercado de trabalho já está suficientemente provido de profissionais. Enquanto isso, as áreas realmente carentes de pessoal qualificado não têm cursos. Como se não houvesse um crescente número de profissões destinadas a desaparecer, diante da profunda mutação imposta pela Revolução Industrial tecnológica.
Enquanto o Brasil não acordar para oferecer à juventude opções de cursos profissionais que garantam sobrevivência digna e contínuo aprimoramento, com vistas à realização plena dos objetivos dos sonhadores, continuará a existir fuga de talentos. Para prejuízo nosso e de nosso futuro.
(Colaboração de José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da Pós-graduação da Uninove e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo).
Publicado na edição 10.896, quarta, quinta e sexta-feira, 15, 16 e 17 de janeiro de 2025 – Ano 100