Não basta conhecer, é preciso vivenciar outra cultura

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Marcos Pitta

“Contar o milagre, mas não contar o santo”. Este velho ditado torna-se oportuno ao se falar de intercâmbio bem sucedido, que proporciona grandes mudanças na vida pessoal, então, porque não citar exemplos? Acredito que se a experiência é positiva, ela deva ser compartilhada, sim. Claro também que no intercâmbio são diversos os fatores que contribuem para o enriquecimento pessoal. A convivência do dia a dia é um deles.
Convivendo há três meses com os argentinos, percebi algumas de suas características bem particulares e cito duas em especial: o acolhimento e o amor pelo país. Sobre a primeira, não que o Brasil seja um país frio, não é isso, mas os argentinos, demonstram especialmente o quanto são amáveis e como fazem questão de lhe ver por perto. Essa é uma característica latente em todas as pessoas que conheci. A recepção foi entusiasmada, a disponibilidade em ajudar no que fosse preciso, também. Em alguns momentos, era tanta gente querendo ajudar, que não tinha mais porque pedir ajuda. Isso é bom e lhe faz ver o quanto é bom ser ajudado, além de incentivá-lo a fazer o mesmo.
A segunda característica, o amor ao país, talvez seja o que mais me encantou. Como brasileiro, digo quantas vezes forem necessárias, que amo o Brasil, suas distintas culturas e sempre procuro aplaudir tudo o que o país produz. Mas, ao comparar as realidades entre Brasil X Argentina, alguns detalhes fazem a diferença. O civismo é o que mais encanta.
Durante o período de 18 a 25 de maio, é comemorada a Semana de Maio, quando o país teve seu primeiro governo pátrio, conhecido como “La Primera Junta”. Chama atenção a forma como as pessoas celebram a data. Todos usam escarapelas, como um distintivo, com as cores da bandeira argentina presas às roupas, como símbolo da independência, o que, pelo menos em meu núcleo brasileiro, não é nada comum. Quem me contou essa história foi Florentina Bueno, uma das alunas do curso de Comunicação, que tive o prazer de conhecer e que conhece o português. Certamente uma amiga que vou levar para sempre. Flor, como é conhecida, conta que o amor pela pátria é uma questão cultural do país e que essa educação começa tanto nas escolas como em casa: “No meu caso, minha família me ensinou desde pequena a usar a escarapela e cantar as canções e o hino nacional com força, com orgulho, sem vergonha”, conta Flor.
Sem dúvidas, é um fato interessante. Santa Rosa não é uma cidade considerada grande e em todos os pontos comerciais há bandeiras do país estampadas às entradas, como prova do amor à Argentina, independente de todas as dificuldades. Assim como no Brasil, existem muitas manifestações, muitas lutas e, nem por isso, os argentinos se tornam descrentes ou perdem a esperança. Acredito que a harmonia com que todos convivem extrapola seus limites e todo esse amor é visto por quem é de fora.
Ao falar de harmonia, uso a palavra no melhor sentido. Aqui não existem conflitos dentro da sala de aula, por exemplo, são todos companheiros e, acreditem, existe muita diferença de opinião, mas essas diferenças são discutidas de forma harmônica e tranquila, sem exaltação, sem julgamentos e sempre com argumentos de ambas as partes. Um bom exemplo a ser seguido.
Recentemente, os professores estavam em greve por ajuste salarial e as passeatas pelas ruas foram pacíficas, com muitos alunos apoiando seus mestres. Sem conflitos e gritarias e, o mais importante, sem violência.
Claro que existem na Argentina, manifestações violentas e que nem sempre acabam bem, mas não acontecem sempre. Uma das manifestações que presenciei na praça San Martín, em frente à universidade, todos estavam reunidos com cartazes e faixas em apoio aos professores, com música, conversa e muito respeito. Procuro sempre perguntar aos amigos que fiz, os porquês de tal acontecimento ou de tal ato, porque para mim, a cultura tem que ser vivida e não apenas conhecida. Isso é o que me faz aprender.

(Colaboração de Marcos Pitta, universitário em jornalismo no Imesb, fazendo intercâmbio em universidade da Argentina).

Publicado na edição nº 10134, de 1° e 2 de junho de 2017.