O drama de ‘Palmer’ é simples, delicado e enaltece atuações de Justin Timberlake e Ryder Allen

Marcos Pitta

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Drama dos bons - ‘Palmer’ faz jus ao gênero, tira lágrimas de quem assiste e serve para educar.

Estrelar um filme e carregá-lo nas costas não é tarefa fácil, mas foi uma missão cumprida por Justin Timberlake em ‘Palmer’, de 2021, dirigido por Fisher Stevens e disponível no catálogo da Apple TV. O ator e também cantor vive o personagem-título que, após 12 anos na prisão, sai em condicional e retorna para a casa de sua avó, que o criara desde adolescente. Sem rumo e com poucos contatos, como é a realidade de quem sai da prisão e precisa voltar à vida cotidiana, Palmer encontra propósito ao afeiçoar-se por um garoto de sete anos que mora com a mãe, viciada em drogas, em um trailer ao lado de sua casa.

Entra, então, outro personagem desafiador e que consegue dividir o peso do filme com Timberlake, Sam, interpretado por Ryder Allen, que faz sua estreia nos cinemas. Na história, Sam sofre todo tipo de bullying por gostar de brincar com bonecas, de assistir animações ditas pela sociedade como ‘desenhos de meninas’ e por vestir-se de maneira diferente, ou seja, era ditado pelas pessoas daquele local como uma criança “fora dos conformes” esperados.

A força da narrativa é gritante. O roteiro de Cheryl Guerriero é muito bem construído, sem barrigas e sem agitação para apresentar a história. Primeiro, o espectador conhece Palmer e vê sua saga para encontrar um emprego, o que o manterá na condicional. Enquanto o protagonista é apresentado com força, singelamente, o roteiro trata de introduzir Sam, sempre convivendo com a avó de Palmer, por sua mãe o deixar sozinho para sair atrás de drogas com um namorado violento e também drogado.

Após Palmer conseguir um trabalho, o roteiro tem necessidade de unir o destino dos dois, a partir de um acontecimento chave na história. Sam segue sozinho e passa a ganhar, pouco a pouco, a atenção e carinho de Palmer. O mais fascinante na história é que nada é corrido e nem fica forçado, tudo acontece no tempo certo.

As atuações e a boa direção se encarregam de não deixar o filme lento e a carga dramática, principalmente de Ryder Allen transmite ao espectador exatamente o que a tratativa deste tema pede. Ao lado dele, Timberlake segura bem as cenas emotivas que são transmitidas ao público, também sem apelação. Tudo é feito com simplicidade e delicadeza, mesmo sendo um tema forte.

Detalhe importante do roteiro é a tratativa da vida pregressa de Palmer, isto é trabalhado de maneira competente, apesar de que a importância para a história seja o presente. No entanto, a caracterização básica do personagem e toda a construção do ator sobre o passado do personagem e o motivo de sua prisão é um pilar sobre a qual Timberlake constrói seu personagem, conseguindo convencer quem assiste, trazendo toda a carga cultural de Palmer, de criação e também de suas crenças, mesmo que preconceituosas. Com isto, o espectador vê e se identifica com ele, pois Palmer precisa lutar contra si mesmo por diversas vezes, seja para entender quem exatamente é Sam, seja para não fazer besteira e violar sua condicional.

Esta inteligência em criar e viver o personagem reflete-se, também, no ator mirim, que tem um papel difícil nas mãos e consegue mostrar, de cara, entrosamento com Timberlake.

Em papéis menores, mas também fundamentais na história, a professora Maggie (Alisha Wainwright), tem momentos importantíssimos que deveriam servir de exemplo a todos os educadores e educadoras que merecem assistir este filme. É por conta de atitudes dela que a vida de Sam não é ainda pior dentro do ambiente escolar. A atriz Juno Temple, que faz a mãe de Sam, apesar de seu vício e toda a complexidade que o envolve, também não renega quem o filho é, ela o ama de verdade e isto fica evidente durante a narrativa. As duas têm papéis importantes e que contam muito, servindo para enaltecer a história e que podem servir para educar quem assiste ao filme.

O filme, talvez, peque pela simplicidade. Mas, não aplica nenhum desserviço. Poderia e teria como o roteirista e o diretor trabalharem mais a complexidade que o tema exige, mas apostar na produção singela não diminui seu tamanho, pelo contrário, só contribui.

Publicado na edição 10.821, de sábado a terça-feira, 17 a 20 de fevereiro de 2024