
Em 12 de agosto de 1994, o The New York Times anunciou a primeira transação criptografada na internet: um marco que inaugurou uma era de inovação no varejo digital. Desde então, o comércio eletrônico transformou o consumo, superando barreiras de segurança, confiança e territoriais. Agora, a revolução dos Large Commerce Models (LCMs) promete uma nova era no e-commerce, transformando a experiência do usuário em uma imersão personalizada e transformadora.
Os LCMs, inspirados nos Large Language Models, utilizam grandes quantidades de dados para prever e atender as demandas do consumidor de forma autônoma que são capazes de antecipar comportamentos, necessidades e até mesmo ajustar a logística em tempo real. Em um ambiente onde a experiência do usuário é personalizada de maneira altamente precisa, esses modelos são capazes de otimizar o atendimento, desde a recomendação de produtos até a finalização da compra.
Toda essa personalização promete atender às necessidades dos consumidores de forma cada vez mais eficaz, no entanto, essa capacidade preditiva implica em um grande volume de coleta de dados. De acordo com a LGPD, apenas os dados pessoais devem ser coletados e tratados com transparência, garantindo ao consumidor acesso claro sobre como suas informações são utilizadas.
O direito à informação e à transparência são fundamentais, assegurando aos titulares o recebimento de informações sobre como seus dados estão sendo usados, guardados e compartilhados. Esse direito, não é limitado apenas a alertar, mas também a possibilitar a liberdade de escolha e o controle sobre a finalidade do uso dos dados pessoais.
O Código de Defesa do Consumidor também desempenha papel crucial, uma vez que o consumidor precisa ser informado sobre os produtos e serviços com precisão. Além disso, a autonomia do consumidor deve ser preservada: práticas que induzam compras ou condicionem preferências podem configurar violações de direitos, especialmente quando não informadas de forma transparente.
Uma das grandes promessas dos LCMs é a automação de tarefas, permitindo que os consumidores deleguem processos inteiros de compra e gestão de pedidos à inteligência artificial. Contudo, à medida que a tecnologia assume o controle dessas interações, cabe questionar até que ponto nossa autonomia é respeitada.
É preciso que a sociedade seja educada, efetivamente, para essa realidade e os impactos do processamento irresponsável dos nossos dados pessoais.
Por outro lado, aumenta a responsabilidade das empresas em proteger essas informações contra acessos não autorizados e vazamentos. A LGPD impõe obrigações sobre a segurança dos dados pessoais, e a não conformidade pode resultar em penalidades severas. Além disso, práticas de tratamento de dados invasivas podem minar a confiança do titular que podem se valer de mecanismos legais contra métodos abusivos e enganadores.
Com o e-commerce se tornando cada vez mais sofisticado, permite ofertas e recomendações ultradirecionadas. Durante a Black Friday, os consumidores devem estar especialmente atentos com práticas abusivas e pouco transparentes. A automação excessiva pode levar a uma experiência impessoal, onde o consumidor, pressionado pelo tempo e pelas ofertas, sente-se compelido a comprar sem entender completamente os termos da oferta.
O desafio é transformar informações de privacidade em conteúdo acessível, principalmente nos Termos de Uso e Avisos de Privacidade. É necessário colocar a expectativa do usuário no centro do desenvolvimento de produtos e serviços, a fim de proporcionar uma experiência positiva e de aculturamento digital.
O futuro do e-commerce promete ser mais autônomo e preditivo, mas ele só poderá prosperar de forma sustentável se estiver fundamentado em práticas éticas e em conformidade com as legislações vigentes. Dessa forma, a revolução dos Large Commerce Models não apenas transformará o comércio eletrônico, mas também permitirá que ele avance em direção a um mercado digital mais justo e transparente.
Cuidar da Experiência do Usuário (UX) é fundamental para, além de assegurar conformidade com o ordenamento jurídico, criar e estreitar relações de confiança com os usuários. Isso deve ser feito considerando a ressignificação do direito à privacidade e a evolução para o direito à autodeterminação informacional.
(Colaboração de Rodrigo Toler, advogado de Privacidade e Proteção de Dados no Opice Blum, Bruno Advogados, Mestre em Direito, Tecnologia e Desenvolvimento pelo IDP. Email: [email protected]).
Publicado na edição 10.888, de sexta a terça-feira, 15 a 19 de novembro de 2024 – Ano 100