Os candidatos e suas circunstâncias

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Busquemos, mais uma vez, a âncora expressiva de José Ortega Y Gasset: “eu sou eu e minha circunstância”. A identidade do homem se forma a partir das coisas que o circundam. A metáfora estampa a força do conceito: se uma pessoa está se afogando deve buscar na própria água em que se afoga apoio para se salvar. A recorrência ao celebrado autor de “A Rebelião das Massas”, livro que retrata as grandes transformações do século XX, parece convir nesse momento em que emergem os perfis a se envolverem no pleito presidencial de 5 de outubro. A questão suscitada pelo ensinamento de Gasset é: que nomes arrastariam com mais força para as urnas as circunstâncias que os cercam?

Lula é a fotografia mais nítida do pobre que ascendeu ao mais alto posto da República. A trajetória de Luis Inácio joga-o no palco eleitoral, podendo guindá-lo ao assento presidencial (caso não seja condenado pela Justiça) ou afastá-lo por um bom tempo do centro da política.

As circunstâncias que cercarão o pleito determinarão vantagens e desvantagens de cada pleiteante. Para começar, o cenário de economia recuperada, com inflação baixa, juros em queda, emprego crescendo, será a sombra que deverá acolher o candidato do sistema governista. A recíproca é verdadeira. Se a situação do país piorar, com desequilíbrio nos eixos da economia, o maior beneficiado seria Lula ou o candidato que vier a substituí-lo.

A animação de investidores e o maior consumo criarão o ambiente propício para beneficiar candidatos envolvidos na equação econômica. A rebaixada nota do Brasil pela Standards & Poors pode voltar a ser melhorada. As oposições – PT, PDT, PSB, PSOL e adjacências – seriam acuadas, restando-lhes o previsível discurso contra a privatização de estatais, “a entrega do patrimônio nacional a grupos estrangeiros”, críticas às reformas Trabalhista e da Educação, a Lei da Terceirização, a PEC do teto dos gastos, o decreto sobre Trabalho Escravo, ministros implicados na Justiça, entre outros temas.

Duas hipóteses circundam Lula. A primeira é sobre sua condenação por 3 a 0 ou 2 a 1. Há quem o veja caindo na malha da Ficha Suja, sendo impedido de se candidatar seja qual for o resultado. Nesse caso, o PT teria um substituto, sendo os mais prováveis Fernando Haddad e Jaques Wagner. A segunda hipótese é a de que Lula, mesmo perdendo por 3 a 0, garantiria o nome nas urnas, usando os recursos a que teria direito. Seria julgado no final pelo STJ ou pelo STF. Mas a demora viabilizaria a inserção de seu nome nas urnas. Derrotado antes do pleito, Lula veria o jogo terminar. Se fosse condenado apenas após a eleição, abriria o imbróglio: teria a Justiça condição de cassar uma candidatura lastreada em 50 milhões de votos?

Emergem, agora, as circunstâncias que cercam os candidatos do centro. A primeira é sobre dispersão de votos no centro. Reforçaria posições de perfis sediados nas extremidades do arco ideológico, direita e esquerda. O mais votado do centro disputaria o 2º turno com um dos dois candidatos dos cantos – Bolsonaro, Lula ou seu substituto. Candidato de esquerda ou centro-esquerda poderia puxar o apoio de Ciro Gomes, Marina Silva, Guilherme Boulos. Já Bolsonaro, esse veria fechada a porta do segundo turno. Teria menos de 30 segundos de TV.

Outra hipótese é a união das forças de centro em torno de candidato único. Esse é o melhor cenário, na medida em que reuniria MDB, PSDB, PP, PRB, PTB, PSD evitando a dispersão de votos. Essa ideia passa pela decisão sobre reforma da Previdência.

Considere-se ainda a possibilidade de um ambiente social instável, com militância digladiando nas ruas, discursos acirrados e polarização de posições. O Brasil passou longo tempo convivendo com o apartheid estabelecido pelo petismo. Clama agora por paz. Essas constituem algumas circunstâncias que ditarão o sucesso ou o insucesso dos competidores.

Colaboração dele:Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato

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