
Gaudêncio Torquato
O mês de outubro está à vista, mas a tão proclamada reforma política mais uma vez está em plena escuridão. Ameaça ser um fiasco, após meses de debate. A Comissão encarregada de apresentar uma proposta se vê às voltas de um novelo sem fim. Ora é um fundão de R$ 3,6 bilhões para financiar as campanhas eleitorais, defendido por parcela significativa do conjunto parlamentar, mas repudiado pela sociedade; ora é o distritão, sistema que transforma as 17 unidades federativas em distritos, onde seriam eleitos os candidatos de maior votação.O mês de outubro está à vista, mas a tão proclamada reforma política mais uma vez está em plena escuridão. Ameaça ser um fiasco, após meses de debate. A Comissão encarregada de apresentar uma proposta se vê às voltas de um novelo sem fim. Ora é um fundão de R$ 3,6 bilhões para financiar as campanhas eleitorais, defendido por parcela significativa do conjunto parlamentar, mas repudiado pela sociedade; ora é o distritão, sistema que transforma as 17 unidades federativas em distritos, onde seriam eleitos os candidatos de maior votação.A polêmica se estende por vetores, como a cláusula de desempenho, que exigirá dos partidos 1,5% dos votos nacionais (ou 9 deputados) em 9 Estados, no mínimo, em 2018, índice que, gradativamente, subirá 3% até 2030; ou o fim das coligações proporcionais, essa parceria que pode juntar alhos e bugalhos no mesmo caldeirão, pelo qual o voto dado em um candidato da esquerda poderá eleger um candidato da direita. O que teremos para 2018? As duas propostas, aprovadas na Câmara, irão ao Senado.Qualquer que seja o resultado, estará longe do ideal. Será uma reforma meia boca.Vejamos o sistema de voto. Dispomos, hoje, de duas modalidades: voto majoritário, adotado para eleger o presidente da República, governadores e senadores; e voto proporcional, empregado na votação de deputados (federais e estaduais) e vereadores. No primeiro, os mais votados são eleitos. Já no segundo sistema, os votos dados ao candidato e à legenda a que pertence são contabilizados e distribuídos proporcionalmente de forma a formar um quociente eleitoral que contemplará determinado número de eleitos, dentro da cota do Estado.O distritão, por exemplo, selecionará os mais votados, de cima para baixo, até completar a cota da unidade federativa. Se o eleitor escolher alguém que ficou abaixo da lista dos eleitos, seu voto será simplesmente desconsiderado.Maneira de corrigir esse desvio seria o emprego do voto distrital misto, pelo qual metade das bancadas seria eleita pelo voto dado ao candidato por um distrito e metade seria escolhida pelo sistema proporcional. Esses últimos são votados em todo o Estado. A metodologia abre uma questão complexa: como escolher os candidatos distritais e proporcionais?O debate será intenso. Fala-se, até, em um semi-distritão, pelo qual seriam atribuídos dois tipos de votos: um para o candidato, outro para a legenda. Nesse caso, o voto à legenda ajudaria outros candidatos, de forma a melhorar a posição dos partidos, ao mesmo tempo em que prestigia a escolha do eleitor.Quanto ao fundão de R$ 3,6 bilhões, trata-se de outra condenável proposta. Primeiro, pelo despropósito que carrega, porquanto o país está no fundo de um buraco de R$ 159 bilhões, déficit fiscal que o governo apresenta em seu orçamento. Nesse momento, abrir os cofres do Tesouro para jogar nas campanhas parece afronta ao eleitorado. Alternativa razoável seria a doação individual, com tetos estabelecidos, transparência e controle por parte do Tribunal Eleitoral. A questão é complexa. Voltar com o sistema de doação de recursos por empresas privadas seria recuperar as estruturas que resultaram na Operação Lava Jato.Esses custos serão bem menores quando o país contar com menor número de siglas, entre 8 a 10. É um exagero uma moldura com 35 siglas registradas oficialmente, das quais 25 têm representação congressual. Daí a extrema necessidade de aplicação da regra proibindo a existência de partido sem votos. A cláusula de barreira se faz necessária. A aprovação do índice de 1,5% dos votos para deputado federal, percentual a ser atingido em pelo menos nove Estados pelos partidos, é um começo. A existência de poucos partidos deixará mais clara a tábua do pensamento nacional, repartido entre ideários de esquerda, centro-esquerda, centro, centro-direita e direita.A renovação política seria a consequência do esforço pelo aprimoramento de nossa democracia.
(Colaboração de Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato).
Publicado na edição nº 10172, de 31 de agosto e 1º de setembro de 2017.