
A reforma tributária em curso no Brasil iniciou nova etapa na última semana. Projetos de leis complementares foram apresentados visando regulamentar alguns importantes detalhes das alterações que serão promovidas no sistema tributário nacional nos próximos anos. Dada a importância da regulamentação em questão, é crucial para os tomadores de decisão, seja o(a) CEO de uma grande companhia, seja a(o) dona(o) de casa que controla o orçamento doméstico, que acompanhem os desdobramentos dessa questão.
Fazendo um breve apanhado sobre o assunto, a reforma tributária em curso visa a alteração da sistemática de tributação sobre o consumo de bens e serviços no Brasil. Em resumo, cinco tributos – IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS – serão gradativamente substituídos ao longo dos próximos oito anos por três novos tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo (IS). Há, também, algumas mudanças pontuais em relação a tributos sobre a propriedade e sobre as doações e heranças, tais como o IPVA, o IPTU e o ITCMD. Todas estas alterações serão realizadas paulatinamente ao longo dos próximos anos.
A mudança estrutural do sistema tributário nacional foi concluída em dezembro de 2023, com a promulgação da Emenda Constitucional 132, que modificou o texto da Constituição Federal em relação aos tributos. A etapa ora em curso diz respeito à regulamentação de alguns importantes pontos da reforma, isto é, definir os detalhes do sistema de tributação que será implementado ao longo dos próximos anos, sempre em linha com as determinações constitucionais sobre o tema. Assim, nessa etapa da reforma tributária, é possível definir e negociar politicamente alguns detalhes dos novos tributos e do sistema tributário que teremos no Brasil no futuro, porém as bases da reforma já estão consolidadas na Constituição Federal.
Dentre os pontos ainda em aberto, que constam dos projetos de leis complementares apresentados e que, mediante negociação política, ainda podem ser modificados, destaca-se a definição da alíquota conjunta da CBS e do IBS – saber qual o tamanho da mordida do leão no bolso dos cidadãos e das empresas. A redação original dos projetos de leis complementares indica uma alíquota conjunta que se situará entre 25,7% e 27,3%. Esse espaço de manobra ainda existe e teremos uma definição exata da alíquota quando os trâmites legislativos da reforma estiverem encaminhados, isto é, quando o cenário de incentivos fiscais e de políticas públicas de arrecadação estiverem mais bem delineados. A alíquota é o coração de um tributo, pois externaliza o parâmetro objetivo do quanto será tomado do patrimônio do particular, razão pela qual sua definição é de suma importância para essa e qualquer outra modificação do sistema tributário.
Um outro ponto em aberto que gera curiosidade, preocupação e polêmica em iguais e altas medidas é a definição de quais produtos e operações ficarão sujeitas ao IS que, como o próprio nome já indica, incidirá sobre determinadas e selecionadas atividades e bens que sejam considerados prejudiciais à saúde humana, à sociedade e/ou ao meio ambiente. Dada a amplitude dos termos e definições – o que eu posso considerar prejudicial à sociedade não necessariamente pode ser considerado prejudicial por você –, é bem provável que as discussões envolvendo o quê e quanto será cobrado de IS gerem debates acalorados e embates políticos, o que é perfeitamente normal e esperado em uma democracia.
Muitas outras importantes questões serão definidas nessa etapa da reforma tributária, com implicações diretas sobre os mais variados segmentos da economia e da sociedade, com destaque especial, mas não somente, para o agronegócio, os prestadores de serviços e os exportadores. Nesse sentido, é fundamental que todas as pessoas, do autônomo ao industrial, do produtor rural à advogada, da professora ao padeiro, da empreendedora ao mecânico, estejam atentas aos trâmites legislativos dessa importante etapa da reforma tributária, vez que os impactos serão sentidos pelo bolso de todos. Os próximos meses prometem ser agitados na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
(Colaboração de José Mário Neves David, advogado, conselheiro e consultor. Contato: [email protected]).
Publicado na edição 10.841, quarta, quinta e sexta-feira, 8, 9 e 10 de maio de 2024