Socialistas e socialistas

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Antonio Carlos Álvares da Silva

Quem tem uma vida longa, vê muita coisa entrar e sair de moda. Quando morei em São Paulo, há 60 anos, a cidade tinha pouco mais de 1 milhão de habitantes e poucos automóveis. As pessoas andavam a pé, ou de ônibus. Como sempre choveu muito na capital, a maioria usava capa de seda italiana e revestia seus sapatos com galochas. Para quem não conheceu esse artefato, galocha era um invólucro de borracha, que envolvia os pés e impedia, que eles se molhassem, sob o efeito da chuva escorrendo e as poças d’agua. Esse revestimento era tão usado pelos andantes, que até originou a expressão “Chato de Galocha”, com que as pessoas mais requintadas denominavam os mortais comuns. A impermeável capa de seda italiana – também chamada seda de paraquedas – e as galochas saíram de moda há muito tempo e não me lembro de nenhum renitente, que ainda teima em usá-las.
Porém, quando a moda se refere a conceitos ideológicos, é mais difícil ela passar e ser esquecida. Quando eu era jovem, a moda entre estudantes e intelectuais era ser socialista, inclusive por ser considerado chique. O tempo foi passando e os alicerces do socialismo foram ruindo paulatinamente. Acabou na União Soviética, na Europa, com a queda do Muro de Berlim, com a morte de Mao na China e a reunificação do Vietnã. No mundo inteiro grande parte das pessoas deixou de ser socialista. Mas, o socialismo não desapareceu. Acontece, que ele é uma bandeira. Quem não acha outra, para substituí-la, acaba ficando com ela. Principalmente, se precisar de uma, para se manter ativo, na vida pública e na política. E, entre intelectuais e artistas, ele continua sendo chique. É considerado como um verniz, que enriquece a personalidade (ou a vaidade). Dois fatos recentes me fizeram trazer esses pensamentos de volta. O primeiro, aconteceu com Chico Buarque de Holanda no Rio de Janeiro. Todos conhecem Chico. Ele é compositor, cantor e escritor de livros de sucesso. Ele conversava em um lugar público, quando foi hostilizado por um grupo de pessoas, em razão de ainda se manter petista, apesar da infinidade de escândalos de corrupção, que envolve o governo de seu partido. O episódio mostra que socialista não muda, aconteça, o que acontecer. Estava eu com essa conclusão na cabeça, quando uma notícia abalou minha convicção. Ela conta, que foi lançado no Chile o livro “Diálogos de Convertidos”. Foi escrito por Roberto Ampuero e Maurício Rojas. Os autores cresceram na utopia socialista e militaram em associações do gênero – Juventude Comunista e Movimento Revolucionário – MIR. Nessas fileiras contribuíram com a fratura e caos econômico/político, que foi o governo de Salvador Allende. Essa situação provocou o golpe de Pinochet. Para fugir da repressão e da tortura, ambos foram obrigados a se exilarem em países comunistas da Europa. Lá, eles continuaram militando na Esquerda mais radical. Porém, também sentiram na carne os problemas do “Socialismo Real” – pobreza, burocratização, censura e asfixia política – Essas agruras conduziram ambos à “Conversão” à democracia. Depois, ao liberalismo vigente na Europa Ocidental. Eles relatam essa conversão no livro. É um ensaio político e de filosofia social. Mas, acaba sendo lido com a curiosidade, com que se lê romances. Eles relatam com franqueza suas experiências socialistas, o que dá ao livro a autenticidade e o realismo da coisa vivida. Esse resumo do livro contado em artigo de Vargas Llosa me convenceu, que algumas pessoas podem perceber a fantasia do socialismo, depois de viverem sob seu regime. Contudo, continuo duvidando, que políticos brasileiros tenham a mesma atitude. Sempre é mais fácil persistir na ideologia socialista, quando está sobrando dinheiro no bolso. É o caso de Chico Buarque de Holanda, Lula e quejandos.

(Colaboração de Antônio Carlos Álvares da Silva, advogado bebedourense).

Publicado na edição nº 9934, de 9, 10 e 11 janeiro de 2016.