Um “NÃO” bem grande para o cigarro

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De acordo com o Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), em 2014 surgirão mais de meio milhão de novos casos de câncer no Brasil, muitos deles creditados ao consumo do cigarro. O custo imposto à saúde do país ultrapassa os 20 milhões de reais (projeção feita para números de 2011 pela Aliança de Controle de Tabagismo), sendo que desses, menos de um terço retorna aos cofres públicos em forma de impostos.
Por outro lado, o Brasil continua sendo o maior exportador de tabaco do mundo. A Souza Cruz detém mais de 70% do mercado brasileiro e é uma das empresas mais lucrativas do setor, com resultado líquido em 2012 na casa dos 1,64 bilhão de reais, o maior de sua história de 110 anos.

Paradoxo da regulamentação

Há exatos dois anos a lei 12.546/11, que prevê ambientes fechados livres de fumo em todo o país e a proibição da propaganda de cigarros em pontos de venda, foi sancionada pelo legislativo brasileiro. De lá para cá ela deveria ter sido regulamentada, com texto que pudesse ser cumprido integralmente por todos.
Entretanto, até o presente momento a lei dorme inquieta na gaveta da presidente da república, que sequer teve alguns minutos para ler o texto e o fazer valer no território nacional. Nesse intervalo de tempo, o relapso do governo provocou a morte de 260 mil pessoas por consumo do tabaco e mais de cinco mil pelo tabagismo passivo. Um paradoxo no país em que a população apóia massivamente a entrada da lei.

A se revoltar
Sabe-se, pelas estatísticas, que mais de 70% dos fumantes iniciam o hábito abaixo dos 18 anos. A indústria tabagista, de olho nessa estatística, tem criado ao longo dos anos, ações indecentes para induzir os jovens ao mundo das drogas. As campanhas cínicas de marketing associando o cigarro ao esporte e à virilidade cantaram mundo afora por muito tempo. Agora elas estão um pouco mais limitadas e, diante disso, a indústria voltou fogo para o sabor, adicionando aromas de cacau, menta, baunilha e canela ao cigarro para camuflar o seu gosto ruim para o adolescente que o experimenta pela primeira vez. Eis aí uma nova porta de entrada para a dependência, para uma saúde comprometida e para uma morte antecipada.

Hollywood no caminho certo

A indústria cinematográfica e a indústria tabagista sempre andaram abraçadas. Atores dos mais cobiçados pela fama de serem durões, sedutores e inteligentes, costumam fumar uma tonelada de cigarros nas várias cenas em que aparecem, servindo de mau exemplo aos jovens.
Walt Disney, criador de personagens como Mickey, Pato Donald e Zé Carioca, era um fumante inveterado. Chegava a fumar três maços ao dia. Paradoxalmente à história da parceria cinema/tabaco e do próprio Disney, o filme que retrata parte de sua vida, vivido por Tom Hanks e que chegará ao Brasil em 2014, não apresentará nenhuma cena de consumo de cigarros. Devido ao grande apelo infantil, responsáveis por sua criação, pelo menos desta vez, tiveram o bom senso de evitar cenas tabagistas. É óbvio que tal preocupação é fato isolado nessa indústria, mas ao menos uma vez Hollywood se postou no caminho certo, tomando uma decisão inteligente.
Quem sabe nossa presidente não assista ao filme, e entre uma pipoca e outra, também tome o caminho certo, regulamentando finalmente a lei 12.546/11. Seria um novo paradoxo e uma nova decisão inteligente.
Que venha 2014, com seus paradoxos e suas decisões inteligentes. Precisamos muito!

Publicado na edição nº 9646, dos dias 16 e 17 de janeiro de 2013.