O que fazer quando uma pessoa se submete a cirurgia para alteração de sexo. Decisões dos tribunais brasileiros têm permitido a alteração de nome do transexual no cartório de Registro Civil.
Arpen – SP
Dando seqüência às possibilidades de alteração do nome civil, deparamo-nos com a questão da alteração de nomes dos chamados transexuais.
O transexual pode ser definido como sendo o indivíduo que nasce com características físicas de um sexo, mas pensa e se comporta como uma pessoa do sexo oposto. Essa dicotomia, que não se confunde com o homossexualismo ou com o bissexualismo, faz com que o transexual rejeite seu fenótipo o que, não raramente, o leva à automutilação ou até mesmo, em casos mais extremos, ao suicídio.
Por se tratar de patologia reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a “síndrome de disforia de gênero”, uma vez diagnosticada, permite ao seu portador a realização de intervenção cirúrgica visando à adaptação de suas características físicas sexuais ao seu “verdadeiro eu”, seguindo-se os critérios definidos na Resolução nº 1.652/02 do Conselho Federal de Medicina.
Contudo, a harmonização obtida entre corpo e mente é apenas o primeiro passo. Resta agora ao transexual buscar, pelas vias judiciais, o reconhecimento de sua nova identidade.
Quanto à alteração do nome pelo transexual, são importantes algumas considerações. O transexualismo não constitui exceção prevista legalmente para modificação de nome civil, muito embora a jurisprudência (decisões) oscile neste ponto ora admitindo a alteração com fundamento na proibição da exposição ao ridículo do indivíduo, ora a permitindo com fulcro na substituição por apelido público e notório. A verdade é que a ausência de tipificação fechada não representará óbice à tutela jurisdicional pretendida, uma vez que o sistema registral também se submete ao império da Lei Fundamental e aos princípios que dela ecoam, dentre os quais o da dignidade da pessoa humana. Ademais, é necessário destacar que a alteração deve recair somente sobre o prenome (primeiro nome) do transexual, pois este é o elemento que permite a identificação imediata do gênero do indivíduo; o sobrenome, nesta situação, será imexível.
Obtida a alteração pretendida, o juízo processante expedirá mandado ao cartório competente para fins de averbação junto ao registro de nascimento do transexual. Nesse aspecto, é importante que conste no mandado judicial a determinação expressa de que nenhuma referência à mudança deve constar nas certidões que venham a ser extraídas, cujo acesso ao seu teor fica condicionado à autorização judicial. Esta é, pois, a atual orientação do Superior Tribunal de Justiça. Com isso, a dignidade do transexual estará protegida.
A alteração procedida, entretanto, não isenta o transexual de agir de acordo com os ditames da boa-fé nas relações jurídicas que vier a assumir, principalmente no casamento, cujas conseqüências pela sua não observância, neste particular, vão desde a possibilidade de anulação do casamento por erro essencial quanto à pessoa até a responsabilização civil por abuso de direito.
(Colaboração da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo – Arpen-SP. Texto produzido por Gustavo Renato Fiscarelli, Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas de Olímpia-SP).
Publicado na edição nº 9646, dos dias 16 e 17 de janeiro de 2013.