Abrir os olhos para a mudança

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Hoje, mais do nunca, ecoam nos movimentos sociais e nas vozes idealistas, a vontade de mudança e de transformação da nossa sociedade. As estruturas ultrapassadas que sustentam a nossa sociedade estão sendo cada vez mais expostas; e a defesa por uma reforma estrutural ganha mais força a cada dia que passa.

Definitivamente, vivemos tempos difíceis. E citando o filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulan” (2001): “são tempos difíceis para os sonhadores”. E por que são tempos difíceis para os sonhadores? Pois a medida em que, através da educação libertadora, os sonhadores passam a enxergar as amarras do sistema que nos manipulam como marionetes; eles começam a observar o mundo com outros olhos – enxergando a possibilidade de mudança – e, neste processo, também se atentam aos esforços que são feitos para que essa mudança não se concretize. A educação libertadora nos torna sonhadores, ao mesmo tempo em que nos mostra a triste realidade da nossa sociedade.

A educação como prática da liberdade, defendida por Paulo Freire (2017) e bell hooks (2017), é a maneira pela qual se pode reverter a desumanização, a injustiça e a opressão. A educação como prática da liberdade, segundo os autores, deve promover a criticidade e uma análise profunda das nossas relações de poder e organização da sociedade, abrindo caminho para o “processo de libertação”. A intelectual bell hooks afirma que “Todos nós teríamos nos saído melhor em nossas lutas para acabar com o racismo, o sexismo e a exploração de classe se tivéssemos aprendido que a libertação é um processo contínuo. Somos bombardeados todos os dias por uma mentalidade colonizadora… ”(p. 26, 2010). É preciso refletir e questionar.

Presente na Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, a educação de qualidade concretiza-se como um objetivo global (4), não apenas para a capacitação dos indivíduos para o mercado de trabalho, mas para a promoção da mudança que o mundo precisa. “Um aluno, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo. A educação é a única solução.”, defendeu Malala Yousafzai, na sede da ONU, em 2013.

Vivemos a chamada era da informação, onde o acesso a conhecimentos e ideias é amplamente facilitado pela democratização e acesso à internet. E é frustrante observar, que mesmo com essa possibilidade de libertação “em massa”, através do acesso coletivo ao conhecimento, que ainda haja um exército de manipulados – que não só sabotam a sua libertação, mas também sabotam a libertação alheia, através do constrangimento e do “repúdio” aos que sonham com um mundo melhor (como a defesa dos Direitos Humanos, por exemplo). Paulo Freire explica: “Os oprimidos que introjetam a “sombra” dos opressores e seguem as suas pautas, temem a liberdade, na medida em que esta, implicando a expulsão dessa sombra, exigiria deles que “preenchessem” o “vazio” deixado pela expulsão com outro “conteúdo” – o de sua autonomia.” (p. 46, 2017).

Freire afirma que “não é possível um compromisso verdadeiro com a realidade, e com os homens concretos que nela e com ela estão, se desta realidade e destes homens se tem uma consciência ingênua” (p. 26, 2016). É preciso rejeitar a ingenuidade, e reconhecer a responsabilidade que temos com a mudança da nossa sociedade. É preciso abrir os olhos para a mudança, e lutar e defender a educação como prática da liberdade.

(…)

Publicado na edição nº 10273, de 14 e 15 de junho de 2018.

(Colaboração de Arthur Fachini, formado em Relações Internacionais, ativista pelos Direitos Humanos e igualdade de gênero. Atualmente é responsável pelo projeto “Defensores Globais”, na Escola Estadual Abílio Manoel).