As impressões da escritora Andradina de Oliveira sobre a cidade de Bebedouro em 1921

José Pedro Toniosso

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Visitante - Andradina de Oliveira tem sua foto publicada nos livros “Contos de Natal,” em 1908 e “O Perdão”, em 1910. (Foto: https://pt.wikipedia.org/wiki/Andradina_de_Oliveira)

Nas primeiras décadas do século passado, Bebedouro recebeu a visita de diversas figuras de projeção nacional, algo que era facilitado pela ligação direta com a capital por meio da linha férrea. Embora a maioria destes visitantes fosse do sexo masculino, registrou-se também a presença de algumas mulheres.

Entre elas destaca-se a visita da escritora gaúcha Andradina América de Andrade e Oliveira (1864/1935), cujas impressões sobre a cidade foram publicadas na edição de 16 de outubro de 1921, do “Jornal de Bebedouro”, sob o título “Atravez da minha Pátria.”

Professora formada pela Escola Normal de Porto Alegre, Andradina lecionou em várias cidades gaúchas, além de ministrar conferências e escrever artigos sobre os direitos das mulheres. A dedicação ao trabalho intelectual foi a forma que encontrou para garantir o seu sustento e dos dois filhos, pois ficara viúva muito jovem.

Em 1898, fundou na cidade de Bagé, o jornal literário, artístico e noticioso “Escrínio”, no qual difundia os ideais feministas. Publicou vários livros, entre eles “O perdão” (1910), e “Divórcio?” (1912).

Perseguida pelos setores conservadores por conta de suas ideias consideradas avançadas, deixou o Rio Grande do Sul e entre 1915 e início da década de 1920 realizou uma turnê cultural com sua filha pela Argentina, Uruguai, Paraguai e interior do Brasil, realizando palestras e vendendo seus livros.

Foi neste contexto que esteve em Bebedouro, visitando os principais logradouros e sendo recebida pelas autoridades e moradores em geral. Como resultado desta visita Andradina escreveu suas impressões, conforme trecho transcrito a seguir:

Atravez da minha Pátria. Em Bebedouro:

“Bebedouro será, sim, uma das bellas urbes do interior de São Paulo, quando terminar o seu remodelamento. A sua topographia é excellente. Rodeiam-na lindas collinas que as primaveras alfobram e florescem.

A cidade é edificada sobre um planalto à margem direita do ribeirão Bebedouro.

As suas ruas, em geral rectas, ficarão bellissimas, quando calçadas e arborizadas. Há cinco praças que vão ser ajardinadas, modernamente, e que ostentarão a belleza das mais peregrinas flores e especimes raras da nossa flora, que é a mais rica do globo.

Está em reconstrucção a Cathedral, que, sob a invocação de São João Baptista, fica no coração da cidade, a bella praça Rio Branco. É um templo de largas proporções e que, concluído, será de aspecto imponente, magestoso.

Nota-se na architectura da cidade um cunho impressionante de elegância e modernismo. Há vivendas verdadeiramente encantadoras, palacetes de luxo, que aformoseiam as ruas que, apesar de não estarem calçadas, ainda são asseiadíssimas.

O Paço Municipal, prédio próprio, é vistoso exteriormente, muito bem dividido. A sala de sessões é linda. O seu mobiliário, sahido das officinas da Penitenciária, em São Paulo, é magnífico. […] Fica também situado à Praça Valêncio de Barros, o bello Grupo Escolar.

Numa das praças de Bebedouro está collocada a herma em bronze, de Jocelym de Godoy, grande jornalista paulista e que é um meritoso trabalho artístico.

Entre os edifícios públicos, Santa Casa de Misericórdia, Cadeia, Fórum, Odeon e outros destaca-se o Cinema Rio Branco, da conceituada Empresa Theatral Paulista, […]

Centro de três linhas férreas e ligado por outras zonas riquíssimas e prósperas, Bebedouro está destinado a um grande futuro. O trânsito de viajantes é extraordinário. Os hotéis vivem repletos. Delles, o principal é o Hotel Amadeo, levantado à Praça Rio Branco […]

Em rápidos dias e momentos rápidos, pouco se pode dizer de um povo, dos seus costumes, de sua educação social. Mas a maneira altamente cavalheirosa e patriótica porque fomos recebidas pela Prefeitura desta cidade, pelos distinctissimos patrícios, srs. Raul Furquim e Cícero Prates, Prefeito e Vice-prefeito, a cuja benéfica e criteriosa administração, Bebedouro progride, e pelos dignos redactores, das folhas locaes, “O Jornal de Bebedouro”, “A Vanguarda” e “A Folha do Povo”, bem como o tracto ameno que nos hão dispensado outras pessoas, prova, de sobejo, que estamos em uma encantadora cidade, de real cultura social, cívica e até litteraria, dado o número de intellectuaes e amantes das letras e das artes, no afan do seu evoluir mental, empenhados.

Dispondo de um clima salubérrimo será esta sympathica e risonha cidade, em futuro próximo do seu aformosamento, uma das que hão de attrahir, fortemente, o forasteiro e prende-lo na sua hospitalidade.”

(Colaboração de José Pedro Toniosso, historiador e professor bebedourense).

Publicado na edição 10.715, de sábado a terça-feira, 19 a 22 de novembro de 2022.