Bem-estar extremo

José Renato Nalini

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A busca da perfeição física torna o ser humano tão corajoso e audaz, que não teme se converter em cobaia. Uma pesquisa de tendências para 2019 realizada pela Consultoria Trendwatching detectou o que está sendo chamado “Bem-estar Extremo”.
Ninguém hesita em transformar seu corpo, o único que tem, num experimento científico. Procura-se controlar o que se come, o que se bebe, o que se faz, como e quanto se dorme, tudo para adquirir um padrão ideal de beleza. A busca agora é por produtos customizados. Os testes de DNA são acessíveis. A partir daí, empresas como a 23AndMe permitem a obtenção de relatórios genéticos e de programação para o prolongamento da vida com qualidade.
A sofisticação chega ao ponto de produzir cigarro eletrônico de maconha, para controle da quantidade consumida. Chega-se a receber transfusão de sangue de jovens, para que o corpo velho e cansado também se juvenilize.
A malhação nas academias continua em alta, mas desde que acompanhada de anabolizantes e de outras substâncias auxiliares, capazes de rejuvenescer e de causar euforia.
Mas e a cabecinha, como é que fica? Tudo isso é neura, é “encucação”. Não há problema. Quer fugir dos problemas, há substitutivos para o Prozac muito mais poderosos. Para você se distrair, a Netflix vai produzir programas que permitem interação. Você vai ajudando a produzir a trama, altera o rumo da estória de acordo com sua predileção ou estado de espírito.
A tecnologia da “realidade aumentada” vai acelerar o consumo. Permite que a venda de objetos e de móveis se faça através a visualização exata de sua posição dentro da casa do comprador. São pontos de venda mágicos, espalhados até em locais públicos. Um exemplo é aquele utilizado pelo metrô paulistano, cujas câmaras interpretam as expressões faciais dos passageiros e identificam sua reação a um tipo de publicidade mais agressivo.
Com o intuito de disfarçar a predominância da lex mercatória, há um marketing para convencer o comprador de que as empresas têm uma ética muito especial e ditada pelos seus clientes. É o chamado “consumismo positivo”: a partir de identificação com as bandeiras atuais, os produtores as empalmam. Tudo vale para reforço da convicção do consumidor de que escolheu um produto elaborado por um conglomerado “do bem”, que está atento e não descuida da preferência moral do seu cliente.

(Colaboração de José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente universitário, palestrante e conferencista).

Publicado na edição de nº 10409, de 13 a 16 de julho de 2019.