Acontecimentos recentes têm mexido com as expectativas de governos, empresas, estudiosos e profissionais em conexão com a temática ambiental, particularmente em relação ao tema das mudanças climáticas.
O primeiro evento que tem gerado ansiedade em governos e profissionais da área foi a eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos da América a partir do ano que vem.
Para além de quaisquer achismos ou convicções pessoais, o temor que recai sobre a eleição de Trump tem origem em uma conduta adotada em seu mandato anterior. Quando foi presidente, Trump retirou os EUA do Acordo de Paris, que vem a ser um Tratado Internacional sobre mudanças climáticas. E por que isso preocupa?
O Acordo de Paris é um tratado internacional que tem como finalidade principal tentar frear os níveis de aquecimento global médio, considerando os padrões pré-revolução industrial. Idealmente, o resultado desejado é que esse nível não ultrapasse um aumento de 1,5º Celsius, sendo considerado ainda tolerável se não superar os 2º Celsius. Segundo boa parte dos analistas, o planeta já teria ultrapassado os 1,5º Celsius em 2024, e as perspectivas para manter os índices abaixo dos 2º Celsius têm se mostrado cada vez mais desafiadoras.
Os EUA são um dos maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta, senão o maior, e sua saída do Acordo de Paris no primeiro mandato de Donald Trump trouxe retrocessos aos pretendidos objetivos da negociação. Agora, o temor é que uma nova saída dos EUA novamente traga impactos negativos ao Acordo.
Como costuma ocorrer com problemas ambientais – que podem ter diferentes causas e por vezes comportam múltiplas abordagens – essa não é a única causa das dificuldades em se avançar globalmente com os desejados e positivos efeitos do Acordo de Paris.
O mundo tem acompanhado há algumas semanas, as negociações mantidas na COP-29, que está acontecendo em Baku, capital do Azerbaijão. O acrônimo COP29 remete à 29ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas, principal evento multilateral de discussão dos cenários e medidas relacionadas ao combate dos efeitos deletérios das mudanças climáticas.
A par de possíveis dificuldades sobre decisões relativas ao financiamento climático, em que países desenvolvidos e emergentes discutem quem deve “pagar a conta” dos investimentos para um desenvolvimento mais sustentável, há uma expectativa muito positiva em torno do consenso inicial sobre a regulamentação do Artigo 6º do Acordo de Paris.
Referido artigo tem relação direta com a organização e padronização do mercado de créditos de carbono, que vem a ser um dos principais mecanismos de incentivo a práticas ambiental e economicamente sustentáveis. Esse consenso poderá trazer mais integridade ao mercado de créditos de carbono, por isso é visto como importante ferramenta para reduzir custos de implementação dos planos climáticos de cada país, além de estimular países e a iniciativa privada na consolidação do mercado de créditos de carbono.
Muitas vezes o conceito de soberania é invocado para sustentar certas posições em negociações internacionais, seja, como no exemplo citado, para aderir ou deixar a acordos internacionais, seja para tentar justificar posições inflexíveis em negociações multilaterais.
O risco de tais posturas é gerar resultado injusto exatamente para os agentes que estejam a adotar posturas desejadas. A injustiça é tal que pode levar a desequilíbrios de ordem concorrencial, pois alguns mercados (o brasileiro, em particular) podem ser obrigados a competir com outros em condições desiguais, pois estariam assumindo os custos de um desenvolvimento sustentável, e competindo com mercados que não o fazem.
Tratar as questões ambientais de forma global faz sentido, portanto, tanto pelo aspecto econômico, dado elevado grau de interrelação econômica entre os mercados, quanto pelo aspecto ambiental, dada a intrincada correlação, em nível global, entre problemas ambientais de um país a outro, a ponto de muitas vezes não ser possível confinar as consequências ambientais de uma decisão de um país à sua área e população.
(Colaboração de Gabriel Burjaili, professor e advogado, bebedourense).
Publicado na edição 10.890, sábado a sexta-feira, 23 a 29 de novembro de 2024 – Ano 100