Devo, não nego…

José Renato Nalini

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Fazemos blague de coisas sérias. É o nosso estilo, o nosso “jeitinho”. Mas sabemos exatamente o que deveria ser feito. O agravamento da questão climática exige mais do que “simpatia”. É preciso acordar enquanto é tempo e fazer o Poder Público honrar suas obrigações. Além do preceito constitucional, que se sobrepõe a qualquer ideologia, o Brasil firmou compromissos internacionais que tem o dever de levar a sério.

O aquecimento global é antrópico: deriva da ação humana. No Acordo de Paris, o Brasil se obrigou a reduzir as emissões de gás carbônico em 37% em relação a 2005, até 2025. E teria de reduzir em 43% até 2030.

As oportunidades residem na floresta ainda em pé. Fortalecer o cumprimento da lei de 2012 que substituiu o Código Florestal, estimular políticas que levem ao desmatamento zero na Amazônia e demais biomas, compensar as perdas catastróficas da cobertura vegetal com rapidez e efetividade. Até 2030, seria necessária a restauração de vinte milhões de hectares de floresta devastada.

No campo energético, aumentar a participação de bioenergia sustentável à matriz energética, para aproximadamente 18% até 2030, com expansão do consumo de biocombustíveis. Atingir a participação estimada de 45% de energia renovável na matriz energética até 2030 e garantir ao menos 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico até o mesmo ano.

No transporte, obter medida de eficiência, melhorar a infraestrutura e renovar a frota do transporte público, que não poderia mais se servir de combustíveis sujos, não renováveis. A indústria deveria criar novos padrões tecnológicos limpos, ampliar medidas de eficiência energética e encetar a política de baixo carbono.

A agricultura não precisa ser a vilã, com o gado que emite metano por sua digestão e flatulência, inclusive através do esterco, mas adotar tecnologia que viabilize uma criação mais verde, se isso for possível. O agronegócio precisa deixar de pensar só em si e assumir a missão de recuperar mais de quinze milhões de hectares devastados, com o plantio de espécies nativas. Há projetos como o plano de agricultura de baixo carbono – ABC e implantação do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta, LPF, mas somos pródigos em firmar compromissos, normatizar, prometer e não cumprir.

Isso é o que faz lembrar o brasileiro que diz: “devo, não nego; pagarei quando puder”. Só que a natureza não tem paciência. Ela já está mostrando o que virá, se a humanidade não tomar tento, continuar sem juízo.

(Colaboração de José Renato Nalini, reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e Presidente da Academia Paulista de Letras –  gestão 2021-2022).    

Publicado na edição 10.650 – quarta, quinta e sexta-feira – 9, 10 e 11 de março de 2022.